Renovação da desoneração do PIS/Cofins da gasolina pode reduzir o Ebitda do grupo sucroalcooleiro em 2023
Segurar estoques e aproveitar para vender etanol quando os preços estiverem melhores. A tática da São Martinho — um dos maiores grupos sucroalcooleiros do país — não é nova, mas parece embutir um nível de risco maior do que o usual.
Desde que o governo federal zerou a PIS/Cofins e Cide da gasolina, reduzindo a competitividade do etanol nas bombas, a companhia liderada por Fabio Venturelli vem segurando o biocombustível no estoques, mas a aposta pode esbarrar no governo.
Em tese, o fim da desoneração da gasolina, previsto para janeiro, deveria compensar o custo de capital de giro com o aumento da competividade do etanol, mas desta vez nem todos estão convictos de que a cobrança de PIS/Cofins vai mesmo ser retomada.
Ainda há uma eleição pela frente, mas Bolsonaro já sinalizou que poderia manter a desoneração federal em 2023. Além disso, o projeto de lei orçamentária enviado na semana passada ao Congresso Nacional prevê a extensão da desoneração, com um impacto de quase R$ 53 bilhões.
"A esperança para o preço do etanol andar no começo do ano depende do fim da desoneração, mas o governo está falando em manter a isenção de impostos federais em 2023", disse um analista ao Pipeline
Num evento organizado pelo Credit Suisse com mais de 100 investidores institucionais, o CEO da São Martinho reiterou a confiança na estratégia da companhia. Mesmo quando perguntado por clientes do banco sobre a decisão de outros concorrentes também segurarem estoques, Venturelli minimizou o risco de um excedente de etanol no início de 2023.
"Venturelli explicou que as usinas de pequeno e médio porte não têm uma capacidade de estoque tão significativa quanto a da São Martinho, que possui o maior nível da indústria. Sendo assim, ele não acredita em um problema de sobreoferta no próximo ano", escreveu o analista Victor Saragiotto, em um relatório publicado ontem.
Na semana passada, os analistas do BTG Pactual fizeram uma análise de sensibilidade com os impactos da renovação da isenção tributária — o que significa menos R$ 0,30 por litro de etanol comercializado. Na São Martinho, esse impacto chegaria a 7% do Ebitda ou R$ 266,7 milhões. Adecoagro, Jalles Machado e Raízen sofreriam impactos de 8% (R$ 169 milhões), 6% (R$ 72,3 milhões) e 4% (R$ 597 milhões), respectivamente.
"A tempestade perfeita do etanol vai continuar no próximo ano?", perguntaram os analistas Thiago Duarte, Henrique Brustolin e Pedro Soares, em relatório do BTG Pactual sobre a possível manutenção da isenção tributária.
Os analistas ponderam que ainda há um caminho pela frente — a lei precisa passar pelo Congresso — e alguns mecanismos de mitigação poderiam ajudar, como o preço dos créditos de descarbonização (CBios) e a melhora da produtividade dos canaviais (se São Pedro ajudar com chuvas dentro da normalidade, a produtividade agrícola poderia ajudar a diluir o custo).
De qualquer forma, o fato é que os riscos ficaram maiores. Os preços baixos do etanol também podem direcionar mais cana para a produção de açúcar, o que poderia repercutir negativamente nos preços da commodity.
A São Martinho, que acaba de entrar no Ibovespa, está avaliada em R$ 10,1 bilhões na bolsa. O papel acumula queda de 15% em 2022.
Pipeline / Valor Econômico (05/09)