Após 160 anos, Czarnikow vê horizonte além do açúcar

Após 160 anos, Czarnikow vê horizonte além do açúcar

A centenária trading inglesa Czarnikow, fundada em 1861 e controlada atualmente pela fabricante britânica AB Sugar e pelo banco de investimentos Macquarie, está passando pela maior transformação de sua história. Após longos anos dedicada ao comércio global de açúcares de todos os tipos, a companhia, que faturou US$ 4,3 bilhões no ano passado, está colocando em prática sua nova estratégia de ampla diversificação, passando a atuar como fornecedora de produtos e soluções em diversas cadeias de suprimento para clientes industriais.

A mudança é fruto de três anos de planejamento e conversas para a compreensão das “dores” das indústrias com quem a Czarnikow já tem relacionamento. Neste meio tempo, as mudanças no contexto geopolítico, com a pandemia e a guerra na Ucrânia, aumentaram a urgência da nova estratégia. “Com a pandemia e a guerra na Ucrânia, houve disrupções nas cadeias globais de fornecimento e ficou evidente a necessidade de alternativas”, disse Robin Cave, CEO da Czarnikow, que recebeu o Valor em sua recém-concluída visita ao Brasil.

Unidades de negócios
A partir deste ano, a Czarnikow está começando a atuar em quatro áreas de negócios. A primeira é voltada ao trading de produtos agrícolas em geral, englobando desde o açúcar bruto até grãos como soja, milho e trigo. Já em 2022, a companhia fez seu primeiro embarque de grãos, movimentando produtos da Austrália para o Oriente Médio, dos Estados Unidos para a Tailândia e do Brasil para a República Dominicana. O Brasil deve ser um grande “hub” de originação, motivo que levou a companhia a abrir três novos escritórios no interior.

Uma segunda unidade de negócios é dedicada a alimentos, ingredientes e embalagens (FIP, na sigla em inglês). Esta divisão engloba desde os açúcares já processados, como o açúcar branco, passando por concentrados de frutas, pasta de tomate e estabilizante de alimentos, incluindo ainda resinas, embalagens de papel, vidros e resinas, entre outros.

Outra vertical de negócios está relacionada a energia, mas voltadas principalmente à transição energética. Entram neste escopo desde as negociações entre compradores e vendedores de etanol e comercialização de energia elétrica, até trading de biomassa para apoiar a transição de indústrias ainda muito dependentes de carvão e gás natural. “Há interesse [na comercialização de biomassa] desde o downstream até o upstream”, diz o executivo.

A Czarnikow quer apostar na biomassa oriunda de resíduos agrícolas, tanto da colheita da cana-de-açúcar em diversos países como de outras culturas. Embora boa parte dos negócios de biomassa no mundo ainda seja regional, a trading pretende atuar como fornecedor global. A companhia vê oportunidades de originar biomassa principalmente no Brasil, América Central, China, Vietnã, Tailândia, Filipinas e Indonésia.

A quarta e última vertente de negócios da Czarnikow está relacionada a outros serviços que a empresa já presta, como consultoria de mercado e atuação em finanças corporativas. Segundo Cave, a ideia é que a Czarnikow possa atuar como especialista em soluções completas para as cadeias de suprimento.

Esta divisão não limita as possibilidades de negócios que a companhia pode e quer desenvolver. Um exemplo é o investimento que a Czarnikow está empreendendo com a companhia sucroalcooleira CMAA, de Minas Gerais, em uma fazenda de painéis solares. Mas as opções de negócios são inúmeras. “Se um cliente quiser um investimento de pelletização [de biomassa para consumo energético], ou precisa de máquinas para mudar sua produção, podemos apoiar”, exemplifica Tiago Medeiros, diretor da Czarnikow no Brasil.

A companhia deve continuar apostando em um modelo “leve” em ativos - sem patrimônio físico próprio -, e eventualmente com alguns contratos de arrendamento de estabelecimentos, mas não desconsidera algum investimento em midstream “quando necessário”.

Contratações
Para garantir esta expansão, a Czarnikow vem ampliando sua força de trabalho. No último ano, a companhia aumentou o número de vagas em 19% em relação a 2021, contratando principalmente funcionários que já tinham experiência na comercialização de produtos que a trading está começando a atuar agora. Para fazer frente aos planos de diversificação, a companhia ainda pretende aumentar em mais 61% suas contratações, chegando em 2026 com 500 funcionários.

Toda esta expansão está sendo financiada com capital próprio, acumulado ao longo dos últimos anos de crescimento e ganhos em lucratividade. Nos últimos quatro anos, o retorno ajustado sobre o capital empregado (Roce) cresceu dos dígitos todo ano, e seu lucro no ano passado aumentou 16%, alcançado US$ 20 milhões. Em 2022, já incorporando o trading de grãos, a Czarnikow movimentou 7,9 milhões de toneladas de produtos globalmente.

 

Valor Econômico