Incêndios suspeitos não eximem governos de agir contra o aquecimento global.
O avanço das chamas em São Paulo levou à prisão, até esta terça (27), de meia dúzia de suspeitos de provocarem incêndios. Um deles queimou lixo em seu terreno e foi liberado após o caso ser registrado como crime ambiental. Outro diz ter agido em nome do PCC, mas sua vinculação com a facção foi descartada pelo Ministério Público.
A Polícia Civil paulista e a Polícia Federal estão apurando os casos. Por óbvio, devem-se investigar ações propositais ou articuladas. Isso, contudo, não pode ser usado como pretexto para governos se eximirem de enfrentar os efeitos da crise do clima.
Segundo a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, o enorme volume de queimadas em dois dias seria sinal de atividade intencional. Mas essas 48 horas não bastam para explicar o aumento descomunal de focos, não só em São Paulo, indicando que a ação humana pode não ser o fator decisivo.
De 19 a 25 de agosto de 2023, foram registrados 9.428 focos de incêndio no país. No mesmo período de 2024, o número mais que dobrou, indo a 19.767. Em São Paulo, a alta foi de 338%; em Mato Grosso, 236%. Os 3.482 focos no território paulista entre 1º e 25 de agosto são quase dez vezes os 352 de todo o mês no ano passado.
Desde junho de 2023, com o início do El Niño aliado ao aquecimento global, o Brasil apresenta distúrbios climáticos que afetam as cinco regiões —com grandes volumes de chuva no Sul e seca no restante do país. Já se sabia que a estiagem do inverno em 2024 seria intensa.
O governo federal até chegou a aumentar a infraestrutura de combate ao fogo na amazônia, mas as medidas não foram suficientes. Agora, o bioma da região Norte, o pantanal e São Paulo ardem, e a fumaça chega a dez estados.
Que se investiguem possíveis atos criminosos. Mas já passa da hora de o poder público, em todos os níveis, entender que os efeitos da crise climática precisam ser monitorados continuamente, e planos de prevenção e contenção devem ser instituídos com urgência.
Folha de S. Paulo (28/08)