Valor do ATR Volta a Subir - Por Marcos Fava Neves

Valor do ATR Volta a Subir - Por Marcos Fava Neves

(Boletim Cana30: resumo de outubro/novembro e os pontos selecionados para dezembro)

 

Prof. Dr. Marcos Fava Neves, Vitor Nardini Marques e Vinicius Cambaúva

Seguem nossas reflexões dos fatos e números da cana em outubro/novembro e o que acompanhar em dezembro. Na cana, dados da Unica (União da Indústria de Cana-de-açúcar) apontam que até o dia 01 de novembro, a moagem acumulada de cana na região Centro-Sul, desde o início da safra (1° de abril), totalizou 490,2 milhões de t, redução de 2,9% na comparação com o mesmo período do ano passado (era de 504,7 milhões de t). Um destaque do acompanhamento mais recente vai para as operações industriais nos últimas 15 dias de outubro, que somaram 31,5 milhões de t processadas, crescimento de 84,9%.

Este comportamento é explicado tanto pelo atraso no início da colheita neste ciclo, como no encerramento precoce das operações industriais de algumas unidades na safra passada, graças a forte estiagem que prejudicou o desempenho produtivo das lavouras. 208 unidades ainda estavam em operação até o dia 01 de novembro; há um ano, eram apenas 128. Ao todo, 50 usinas já concluíram as atividades e são esperadas outras 73 até o final de novembro.

Outra informação bastante relevante, indicada pela Unica, é que a continuidade das operações neste final de ciclo deve possibilitar que a defasagem entre volume processado de cana-de-açúcar nesta safra versus a passada seja anulada ao final de novembro (quantidade será equiparada). Por outro lado, qualquer ganho adicional dependerá do desempenho nos primeiros meses de 2023.

Em relação a produtividade das lavouras, o Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) informou que, em outubro, registrou 67,3 t de cana por ha, um ganho de rendimento agrícola de 21% na comparação com o mesmo mês de 21/22 (55,5 t por ha). A estimativa foi realizada considerando uma amostra de 73 unidades produtoras na região Centro-Sul.

Já a qualidade industrial da matéria-prima, medida em kg de ATR (Açúcar Total Recuperável) por t de cana, foi de 145,13 kg/t na segunda quinzena de outubro, leve queda de 1,2%. No acumulado da safra 2022/23, o indicador registra 141,35 kg de ATR por t de cana, retração de 1,4%.

O mix de produção entre açúcar e etanol alcançou 45,86% e 54,14%, respectivamente. Há um ano, 45,33% do volume de cana era utilizado para a produção do adoçante e 54,67% para o biocombustível. Em suma, um comportamento bem parecido com o observado no ciclo anterior. Já a eficiência industrial está em 44,84 litros de etanol por t de cana e 61,77 kg de açúcar por t de cana, quedas de 2,4% e 0,2%, respectivamente, no comparativo com 21/22.

No mercado de créditos de descarbonização (CBios), 83% da meta de aquisição para 2022 foi alcançada até 08 de novembro, com a emissão acumulada de 26,23 milhões de CBios. 30,5 milhões de créditos haviam sido adquiridos pela parte obrigada no programa RenovaBio até a data em questão. Informações foram divulgadas pela Unica com base em dados da B3.

E olhando já para a safra 2023/24, o Rabobank estima que a moagem na região Centro-Sul deve ser de 575 milhões de t de cana, alta de 6,5% na comparação com as 540 milhões de t estimadas pelo banco para o ciclo atual. Segundo o relatório, este crescimento será resultado da recuperação na produtividade dos canaviais nos estados produtores. Em relação ao mix de produção, no entanto, o Rabobank indica que isto dependerá de questões tributárias e da política de precificação da Petrobras, no próximo ano, por conta do início do próximo governo.

Por outro lado, considerando a possibilidade de prorrogação da isenção de impostos federais na gasolina e no etanol em 2023, o Rabobank estima que a produção do biocombustível será de 31,1 bilhões de litros (+ 8,7%) e do açúcar em 35 milhões de t (+ 7,7%).

No açúcar, resultado do aumento expressivo na moagem de cana na segunda quinzena de outubro, a produção de açúcar também cresceu, somando 2,12 milhões de t (+ 145,4%). No acumulado da safra (abril - outubro) a fabricação do adoçante chegou a 30,3 milhões de t, 3,0% inferior às 31,2 milhões de t produzidas no mesmo período do ciclo passado; dados também são da Unica.

Para o mercado externo, o Brasil exportou 3,75 milhões de t de açúcares e melaços em outubro, alta de 70,8% na comparação com o mesmo mês de 2021. O volume também foi superior ao resultado já positivo de setembro/22, quando embarcamos 3,08 milhões de t. Em relação às receitas, a alta foi ainda maior, de 90,5%, somando US$ 1,50 bilhão. No acumulado do ano, já exportamos 22,53 milhões de t de açúcar (- 0,8%) com receita de US$ 8,94 bilhões (+ 19,2%).

A Organização Internacional do Açúcar (ISO) revisou sua estimativa sobre o balanço da produção mundial de açúcar do ciclo 2022/23; o superávit passou de 5,5 (agosto) para 6,1 milhões de t (outubro). O saldo é consequência da expectativa de aumento na produção mundial, a qual deve alcançar 182,14 milhões de t, refletindo um recorde na série histórica e valor 3,5% superior aos do ciclo anterior. Por sua vez, o consumo deve desacelerar 0,9% em relação à 2021/22, atingindo 174,3 milhões de t. Já o volume passível de exportação deve chegar a 64,48 milhões de t (ante 62,86 de 2021/22), levando a um cenário de queda de preços, em vistas à obtenção de licenças para exportação em usinas na Índia e estoques acumulados da commodity na Tailândia. Considerando o ciclo atual (2021/22), a organização espera um déficit no balanço do adoçante de 1,6 milhões de t.

No etanol, a produção do biocombustível somou 1,6 bilhão de litros na segunda quinzena de outubro, alta de 48,9% no comparativo com o mesmo período de 2021. No acumulado de 2022/23, foram produzidos 24,45 bilhões de litros do etanol (- 2,7%), dos quais 58,7% ou 14,37 bilhões de litros são do hidratado (- 2,7%); e 41,3% ou 10,07 bilhões de litros correspondem ao anidro (+ 0,7%).

Do total de etanol produzido na segunda quinzena de outubro, 13,7% foram do etanol de milho: 217,83 milhões de litros, alta de 27,6% (era de 170,7 nos últimos quinze dias de outubro passado). No total desta safra, 2,47 bilhões de litros de etanol de milho foram produzidos, alta de 26,5% em comparação com o mesmo período da safra passada. 10,1% de todo o etanol produzido no país já é advindo do cereal.

Outubro foi mais um mês de saídas relevantes de etanol das usinas: ao todo, foram 2,52 bilhões de litros do biocombustível (+ 16,2%), sendo que 2,25 bilhões de litros ou 89,3% foram vendidos para o mercado interno e 271,9 milhões de litros ou 10,7% para o externo. Do volume comercializado no Brasil, 1,31 bilhão de litros foram do hidratado (+ 3,5%) e 941,9 milhões de litros do anidro (+ 11,8%).

No acumulado da safra, temos: no etanol hidratado foram vendidos 10,15 bilhões de litros (- 4,2%), sendo que 94,4% foi para o mercado interno e 5,6% para o externo; e no anidro as vendas somam 7,25 bilhões de litros (+ 14,0%), dos quais 87,0% foram vendidos no território nacional e outros 13,0% no exterior. Ao todo, 17,4 bilhões de litros de etanol foram vendidos em 2022/23 (+ 2,6%).

A produção global de etanol deve atingir 111,1 bilhões de litros durante o ciclo 2022/23, 1,8% superior ao do ciclo anterior ou 2 bilhões de litros, de acordo com ISO. No lado do consumo, espera-se um incremento de 2,1 bilhões de litros, alcançando o montante de 106,6 bilhões de litros. A alavanca na produção advém principalmente do mercado da Índia com políticas mais agressivas de descarbonização, enquanto que no consumo o mercado europeu pode ser o grande limitador, dado o crescimento na frota dos carros elétricos.

E voltando ao etanol de milho, o Rabobank estima que dos 31,1 bilhões de litros de etanol a serem produzidos em 2023/24, 5,9 bilhões de litros serão fabricados com o cereal, alta de 31%. Se confirmado este volume, o biocombustível a partir do cereal participará de 19% de toda a produção nacional. A FS, maior produtora de etanol de milho no Brasil, anunciou o investimento de R$ 115 milhões para a compra de 80 vagões visando ampliar a capacidade de transporte do biocombustível por ferrovias. A ação, efetuada em contrato de parceria com a Rumo, deve elevar o volume mensal de transporte de 50 para 75 milhões de litros, quase metade da capacidade produtiva da FS.

E concluindo a nossa seção do etanol trazendo o comportamento dos preços: em outubro, a média mensal do indicador semanal do hidratado SP (Cepea/USP) registrou a primeira alta após 5 quedas consecutivas (desde o início da safra) e fechou em R$ 2,6803/l (+13,3% que setembro). Vale lembrar que começamos a safra (abril) em R$ 3,6273/l. Vamos observar a questão do consumo neste mês e também os preços do petróleo e da gasolina, afetando a dinâmica do etanol.

Para concluir, os cinco principais fatos para acompanhar em dezembro na cadeia da cana:

  1. Acompanhar a moagem de cana-de-açúcar nestes últimos 2 meses de 2022: qual será o volume? Vamos, afinal, alcançar (ou quem sabe superar) a quantidade do último ano. A expectativa é bastante positiva, mas isto também impacta na oferta dos produtos do setor, alterando dinâmica de preços, negociações e outros.
  2. Alta nos preços do etanol. Nos últimos 30 dias, o preço do biocombustível subiu quase 12 centavos por litro (Cepea/USP). Com o volume de etanol que ainda está sendo produzido pelas usinas, como ficará o balanço entre oferta e demanda? Vale lembrar que nas próximas semanas, com o encerramento da safra, os preços já tendem naturalmente a crescer. Vamos acompanhar.
  3. Decisões político-econômicas do novo governo impactando o setor sucroenergético. Entre elas, destacamos: continuidade da isenção de impostos federais sobre a gasolina e o etanol em 2023; políticas de preços de combustíveis a ser adotada na Petrobras; e outras questões tributárias.
  4. No açúcar: importante observar agora possíveis movimentações das usinas quanto a decisão de produção (mix) para 2023/24. A depender das decisões citadas no item anterior, a tendência pode ser de ampliar o foco em um ou outro produto. É claro que entender a dinâmica global também é essencial; a Índia por exemplo segue com produção estável em sua nova safra, até o momento.
  5. Por último, vamos aproveitar o momento de divulgações dos novos relatórios de consultorias e bancos (e também de entressafra, que se aproxima) para estudar as opiniões e dados para 2023/24, visando desde já elaborar um planejamento que possa reduzir os riscos. Conte com nossas informações para apoiá-los nesta missão!

Valor do ATR - em outubro, o preço do ATR (Açúcar Total Recuperável) registrou nova alta após duas quedas consecutivas, fechando o mês em R$ 1,1079/kg. Lembrando aqui o histórico da safra 2022/23: abril, R$ 1,245/kg; maio, R$ 1,221/kg; junho, R$ 1,186/kg; julho, R$ 1,203/kg; agosto, R$ 1,139/kg; setembro, R$ 1,0662/kg; e agora outubro em R$ 1,1079/kg. No acumulado do ciclo vigente, o preço está em R$ 1,1655/kg. Acreditamos que deve chegar a R$ 1,15/kg até abril/23, ao final da safra.

 

*Marcos Fava Neves é Professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP em Ribeirão Preto e da EAESP/FGV em São Paulo, especialista em planejamento estratégico do agronegócio. Acompanhe outros materiais na página DoutorAgro.com, no canal do Youtube e no MarketClub Sicoob Credicitrus, a quem agradeço ao apoio para elaborar este texto, bem como a co-autoria do Vitor Nardini Marques e Vinicius Cambaúva.

 

Fonte: Marcos Fava Neves (26/11)

 

 

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