Aleiramento da palhada afeta a 1 produtividade da cana-de-açúcar? - Por José Rubens Almeida Leme Filho e Cesar José da Silva

Aleiramento da palhada afeta a 1 produtividade da cana-de-açúcar? - Por José Rubens Almeida Leme Filho e Cesar José da Silva

Na média geral de todo o experimento, foram encontradas produtividades relativamente altas: 134 TCH e 18 TAH na primeira soca e 98 TCH e 14,5 TAH na segunda soca

Após o abandono do uso do fogo para despalha da cana-de-açúcar em preparação à colheita, abriu-se uma ampla gama de possibilidades para o manejo da palhada. O palhiço (resíduo da colheita constituído por folhas, ponteiros e perfilhos mortos) pode ser queimado em caldeiras para aumentar a geração de energia, e pode também ser utilizado como matéria-prima na produção de etanol de segunda geração.

No entanto, a cobertura do solo proporciona benefícios ao ambiente produtivo, tais como redução das perdas de água por evaporação, supressão de plantas daninhas, reciclagem de nutrientes, melhoria da qualidade microbiológica do solo, entre outros. Por essa razão, é agronomicamente desejável a manutenção de pelo menos uma parte dos resíduos de colheita sobre o solo.

Figura 2. Exemplo de aleiramento, onde o palhiço é removido das linhas de cana, mantendo-se cobertas todas as entrelinhas


Quando depositado sobre o solo, o palhiço pode ser deixado em área total, da forma como cai da colhedora, ou pode ser manejado mediante operações, como aleiramento, enfardamento, recolhimento e aleiramento.

De acordo com a União dos Produtores de Bioenergia, Udop, (2016), define-se o aleiramento como a operação de juntar o palhiço de duas ou mais entrelinhas em uma leira, alternada com uma ou mais entrelinhas descobertas (Figura 1). Na prática, o aleiramento é utilizado para preparar o palhiço ou parte dele para subsequentes operações de enfardamento e recolhimento. Por sua vez, o aleiramento consiste em retirar o palhiço das linhas de cana, mantendo cobertas todas as entrelinhas (União dos Produtores de Bioenergia, 2016), conforme a Figura 2.

Popularmente conhecido como “desaleiramento” ou “desenleiramento”, costuma-se proceder o aleiramento quando se pretende mitigar quaisquer efeitos negativos da palhada sobre o desenvolvimento da cana soca. Principalmente após colheita realizada desde o início da safra até julho, quando o desenvolvimento inicial da soqueira se dará em época fria, e para variedades que brotam mais lentamente sob palhada, alguns produtores costumam realizar o aleiramento esperando que o mais rápido perfilhamento inicial favorecido por esta operação contribua para aumento de produtividade.

Neste trabalho, o objetivo foi avaliar as respostas de variedades de cana-de-açúcar, em termos de população final de colmos industrializáveis e de produtividade, ao aleiramento da palhada realizado após colheita em início e meio de safra, com fins de aceleração do perfilhamento inicial.

ALEIRAMENTO E PRODUTIVIDADE

Os resultados apresentados os neste trabalho foram obtidos em experimento conduzido em Dourados, MS, em solo com 76% argila, onde foram avaliados o perfilhamento inicial (contagem de perfilhos 2 meses após colheita), a população final de colmos, as produtividades de colmos e de açúcares em toneladas por hectare (TCH e TAH), de 14 variedades de cana, com e sem o aleiramento do palhiço para aceleração do perfilhamento inicial, em duas épocas de colheita (maio e agosto) e em duas safras (ciclo da primeira soca de 2012 a 2013, e da segunda soca de 2013 a 2014). Na média geral de todo o experimento, foram encontradas produtividades relativamente altas: 134 TCH e 18 TAH na primeira soca e 98 TCH e 14,5 TAH na segunda soca.

Em alguns casos, a produtividade da cana-de-açúcar foi reduzida pela prática do aleiramento, como, por exemplo, na primeira soca do experimento (safra 2012/13), como mostra a Figura 3. A população final de colmos industrializáveis, que constitui um dos principais fatores determinantes da produtividade, também não apresentou nenhum aumento significativo proporcionado pelo aleiramento, apesar do aumento do perfilhamento inicial, o qual provavelmente foi compensado pelo maior abortamento de perfilhos.

Convém observar que os dois anos em que o desenvolvimento das soqueiras foi avaliado apresentaram condições meteorológicas muito diferentes, por exemplo: de julho a setembro de 2013, a segunda soca encontrava-se em início de desenvolvimento, quando foi atingida por diversas geadas. Nada comparável a isso acontecera durante o ciclo da primeira soca, de 2012 a 2013. Portanto, se houvesse alguma chance do aleiramento, com fins de aceleração do perfilhamento inicial, resultar em melhoria de produtividade ou de riqueza em açúcares nesta região, era de se esperar que alguma melhoria significativa fosse observada, pelo menos em algumas variedades, o que não ocorreu.

Figura 3. Números de perfilhos (2 meses após colheita da cana planta), populações finais de colmos industrializáveis por metro linear (em pré-colheita da primeira soca), TCH e TAH, expressos em % do maior valor obtido em cada variável. Valores médios de 14 variedades em (1)duas épocas de colheita (maio e agosto), no ciclo da primeira soca (2012/13) em Dourados, MS. (1) Valores marcados com a mesma letra e referentes à mesma variável não diferem  estatisticamente pelo teste de Tukey, a 5%


Com base nos resultados observados, recomenda-se que, na região sul do estado de Mato Grosso do Sul, não se pratique o aleiramento com fins de aceleração do perfilhamento inicial. Além disso, o palhiço proporciona efeitos excelentes mitigando a matocompetição (CONCENÇO et al., 2017) e as perdas de água por evaporação, e esses benefícios mostraram-se muito maiores quando distribuído em área total (sem aleiramento).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na região sul do estado de Mato Grosso do Sul, não é recomendável a prática de aleiramento (retirada do palhiço de sobre as linhas de cana-de-açúcar, mantendo-se cobertas todas as entrelinhas) com fins de aceleração do perfilhamento inicial das soqueiras. O perfilhamento inicial torna-se mais rápido em algumas variedades quando o palhiço é aleirado entre o início e o meio da safra, mas isso não resulta em maior população final de colmos industrializáveis, sendo compensado pelo maior abortamento de perfilhos.

Além disso, cumpre considerar que para se justificar o custo de qualquer operação seria necessário, no mínimo, algum ganho de produtividade proporcionado por ela, o que não ocorre no caso do aleiramento nas condições edafoclimáticas do sul de Mato Grosso do Sul. Mesmo acompanhando-se o desenvolvimento de 14 variedades de cana-de-açúcar, em duas safras meteorologicamente muito diferentes, não se observou nenhum impacto positivo do aleiramento sobre produtividade de colmos e de açúcares, enquanto alguns impactos negativos foram causados por esta operação. Recomenda-se, portanto, manter distribuída em área total a palhada remanescente como cobertura do solo, maximizando, assim, os benefícios proporcionados pela mesma.

José Rubens Almeida Leme Filho, Engenheiro-agrônomo, doutor em Agronomia, pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste, Dourados, MS. Cesar José da Silva, Engenheiro-agrônomo, doutor em Agronomia, pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste, Dourados, MS