Cana Bis: pode sobrar cana “em pé” em 2015 – Por Dib Nunes Jr.

Cana Bis: pode sobrar cana “em pé” em 2015 – Por Dib Nunes Jr.

A cana bisada poderá voltar a ocorrer no Centro-Sul nesta safra. Conheça os cuidados e as recomendações para tirar o melhor proveito deste fato.

As últimas pesquisas do Grupo IDEA, que acompanha a safra de cana, açúcar e etanol da região Centro-Sul do Brasil, mostraram que haverá um ganho médio de 4% na produtividade agrícola. Ao contrário dos últimos anos, o clima nesta safra se mostra mais chuvoso, sendo responsável por frequentes paralizações na moagem, principalmente no sul do Estado de São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul, onde a incidência de precipitação está sendo maior. Se mantidos, esses índices representarão um adicional de cerca de 20 milhões de toneladas de cana, que estarão disponíveis para serem moídas. A produção de cana do Centro Sul poderá atingir mais de 600 milhões de toneladas.

As boas médias de produtividade agrícola é resultado das condições climáticas favoráveis na maioria das regiões produtoras, mesmo nos canaviais em declínio  ou que receberam menos tratos culturais.

O Centro Sul possui cerca de 8 milhões de hectares com cana comercial destinada à moagem. Com o fechamento de várias usinas, as empresas vizinhas estão adquirindo e moendo a cana disponível, porém ocorrerão limitações físicas e climáticas para moer toda a cana, a não ser que a safra se estenda até os primeiros meses de 2016. Isto não é recomendável dado aos enormes problemas que acarreta principalmente à lavoura.

Muitos são os fatores que indicam uma provável sobra de cana sem cortar para a próxima safra, dentre os quais podemos destacar os seguintes:

  • Início de safra chuvoso interferiu no ritmo de moagem, deixando de se industrializar ao redor de 30 milhões de toneladas de cana, lembrando que a capacidade de moagem média diária do Centro Sul gira em torno de 2,8 milhões de toneladas. As perdas são equivalentes a 11 dias perdidos de moagem.
  • Atraso proposital do início de safra em pelo menos 50% das usinas, tendo em vista o baixo desenvolvimento da cana devido à seca de 2014,
  • Aumento da produtividade agrícola média nas principais regiões canavieiras do Estado de São Paulo (Ribeirão Preto, Jaú, São José do Rio Preto e Piracicaba) em relação às médias estimadas e às médias registradas na safra anterior;
  • Ótimo desenvolvimento da cana de ano, cana de inverno e da cana de final de safra, ao contrário de anos anteriores quando estes canaviais derrubaram as médias da safra.
  • Por outro lado, ao contrário das últimas cinco safras, o clima projeta ser  mais chuvoso devido ao fenômeno El Niño, sendo responsável por frequentes paralizações na moagem, principalmente no sul do estado de São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul, onde a incidência de precipitação está sendo maior.

O que se contrapõe à sobra de cana em pé?

  • As condições climáticas serem favoráveis à colheita até o final de dezembro. Historicamente, isso é difícil de acontecer, pois nos meses de novembro e dezembro chove em média 180 mm e 250 mm, respectivamente. Porém, se chover abaixo destes padrões, todas as usinas tentarão moer o máximo possível, pois haverá demanda, principalmente de etanol.
  • Houve também um significativo aumento da capacidade de moagem das usinas do Centro-Sul.
  • Ribeirão Preto, a principal região canavieira do Brasil, tem mais capacidade de moagem do que cana. Por esta razão, dificilmente haverá cana bis em quantidades significativas nesta região.
  • O aumento da capacidade instalada de moagem das empresas imprimirá um maior ritmo diário, podendo superar 3,0 milhões de toneladas/dia nos meses de agosto, setembro e outubro.
  • Reinicio de moagem em março de 2016 recuperando parte do volume de moagem da presente safra.


Como escolher a cana para bisar?
Nem todas as variedades servem para ser bisadas, uma vez que não brotam bem após o corte ou apresentam florescimento que interrompe o desenvolvimento vegetativo. Esta é uma importante questão a ser analisada, pois as variedades brasileiras são de ciclo curto ou crescimento determinado, sendo que o seu sistema radicular não é vigorosamente renovado quando os rizomas “envelhecem”, ou seja, quando permanecem no solo por períodos superiores a 14 meses. É o mesmo que plantar uma muda velha: sua brotação será comprometida. A falta d’água logo após o corte numa cana bis pode levar o canavial a um “stand” muito fraco no corte seguinte.

O florescimento neste ano está intenso nas regiões norte, noroeste e oeste do Estado de São Paulo, Minas Gerais e Goiás. Entretanto, antes da maior isoporização dos colmos, parte desta cana já será colhida, minimizando as perdas.

A cana que floresce é porque encerrou o seu ciclo de desenvolvimento vegetativo e, quando não é colhida e é bisada, apresenta problemas com secamento, apodrecimento, brotação lateral e brotos chupões, comprometendo a produtividade e a qualidade da matéria prima.

A ocorrência de florescimento depende da latitude da região e da condição climática. Quando chove muito nos meses de fevereiro e março e as temperaturas mínimas noturnas se mostram mais elevadas, acima de 18°C por vários dias consecutivos, favorecendo o fenômeno. Quanto menores as latitudes, maior é a propensão ao florescimento.

As variedades mais indicadas para bisar são as menos propensas ao florescimento. Entretanto dependendo do ano agrícola climático e da localidade, algumas variedades mudam seu comportamento em relação ao florescimento.

Assim, a RB86 7515 que é variedade mais plantada no Centro Sul pode chegar a florescer em Goiás e Minas Gerais, porém será relutante nas regiões mais ao sul.

Por outro lado, a SP83-2847, RB85 5453, RB96 6928 e CTC 2 que são muito cultivadas, podem florescer em quase todos os lugares e todos os anos.

As variedades RB92 579, CTC 9001, CTC 9003, CTC 6, CTC14, IAC91-1099, por exemplo, são mais relutantes ao florescimento e por isso, recomendáveis a serem bisadas. Antes de decidir qual canavial bisar, deve-se fazer uma avaliação do estado vegetativo. Recomenda-se ir ao campo a partir de agosto e abrir longitudinalmente os ponteiros da cana. Algumas podem não ter emitido a inflorescência, mas podem estar induzidas, demonstrando a diferenciação da gema apical. Se ocorrer este fato em mais de 30% dos colmos, esta cana não deve ser bisada.

A escolha do canavial para ser bisado  
Deve haver muito critério e, sobretudo, bom senso na escolha dos canaviais que deverão permanecer “em pé” para a próxima safra. Várias características desejáveis devem ser consideradas para escolha dos canaviais a serem bisados:

  • Não haver florescimento ou indução floral,
  • Apresentar baixo desenvolvimento vegetativo,
  • Não estar tombado ou ter possibilidades de tombar,
  • Estar longe das áreas de risco de incêndio,
  • Além da boa brotação, a variedade deve ter baixa propensão a enraizamento aéreo e brotação tardia,
  • Escolher canaviais de solos mais fracos,
  • Escolher áreas de reforma,
  • Evitar áreas com problemas de pragas,
  • Escolher áreas onde a colheita mecanizada seja possível.
  • Evitar variedades suscetíveis à ferrugem alaranjada.


Desvantagens da cana bis

Há inúmeros problemas e inconvenientes no uso de cana bis, tais como:

  • Maiores perdas na colheita mecanizada,
  • Qualidade de matéria-prima irregular devido às novas brotações,
  • Maiores custos de corte manual,
  • Maiores custos de transporte por menor densidade de carga
  • Brotação irregular, necessitando de água, calor e nitrogênio para brotar.
  • O canavial na colheita pode apresentar duas populações de colmos: a primeira geralmente tombada, com colmos murchos, secos e enraizada, e outra nova, formada por colmos jovens e imaturos.
  • Necessidade de uso de maturadores, principalmente quando há muitos colmos novos,
  • Aumento das impurezas vegetais e minerais,

Outras desvantagens da cana bis, principalmente quando deixada no campo sem critérios, são:

  • Teor mais elevado de dextranas,
  • Baixa pureza,
  • Elevado teor de açúcares redutores,
  • Atraso no corte de variedades precoces,
  • Desvios no caminhamento de safra,
  • Dificuldade de fabricar açúcar de alta qualidade,
  • Maiores gastos com industrialização.

Nem todas as variedades apresentam estes problemas, mas faltam pesquisas e maiores informações a respeito. Um exemplo disto é o comportamento da SP79-1011 que se dava bem como cana bis no Estado de São Paulo. Esta variedade além de apresentar ganhos significativos de produtividade, sua matéria prima era de muito boa qualidade, mesmo quando bisada. Entretanto, esta variedade não tem sido cultivada devido a problemas com a ferrugem marrom.


Quais são as possíveis vantagens da cana bis?

  • Ganhos de produtividade agrícola acima de 25%.
  • Menor gasto com tratos culturais.
  • Flexibilidade para reduzir prejuízo quando os preços do açúcar e do álcool estão ruins, deixando a cana no campo. Seria uma reserva do açúcar e do etanol na lavoura.
  • Aumento do teor de fibra no início da safra.
  • Preenche a falta de cana precoce para iniciar a safra.
  • Apresenta bons teores de sacarose no início da safra.
  • Aumenta o rendimento de colheita.
  • Pode dar açúcar de alta qualidade logo no inicio de safra.
  • Alivia o caixa da empresa.

Tudo isso é possível desde que a escolha da cana para bisar siga as recomendações técnicas deste artigo.


Numa análise mais simplista de fluxo de caixa, pode-se até admitir que a cana bis seja uma alternativa de redução de gastos de curto prazo, pois diminui o desembolso com colheita, tratos culturais e reforma. Entretanto, tendo em vista a necessidade das empresas de fazer caixa, a cana bis pelo menos na atual conjuntura, não é um bom negócio. Se não tiver outra alternativa, recomenda-se escolher bem a cana adequada para ficar para a próxima safra.