Como fazer uma correta avaliação de variedades de cana e das estratégias de colheita

  • Por: MELISSA GOUVEIA
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A maioria dos produtores avalia o desempenho varietal de forma incompleta. Alguns avaliam pela produtividade obtida, misturam alhos com bugalhos e acabam apurando um resultado distorcido que nem sempre demonstra a realidade.

 

É muito comum empresas e pessoas não darem muita importância para estas análises, porém não percebem o quanto podem estar perdendo por não ter uma correta avaliação do comportamento das variedades.

 

Por esse motivo, acabam incorrendo em prejuízos que são, na maioria das vezes, imperceptíveis aos gestores, mas que representam grandes somas se apuradas em profundidade.

 

Perda de ATR: Por exemplo, uma variedade colhida antecipadamente, fora de sua época ideal de corte, pode apresentar perdas de 10 a 12 quilos de ATR ou redução de até 15 toneladas de cana por hectare. Sempre que ocorre um fato destes ninguém analisa o tamanho do prejuízo e nem mesmo é cobrado por isso. Não faltando cana na fábrica, então está tudo bem.

Em uma das auditorias que fizemos recentemente pelo Dr. Cana, encontramos o seguinte resultado:

 

Tabela 1: Perda de açúcar por antecipação de corte

 

Esta tabela resume toda a safra de uma usina na região de Ribeirão Preto e reflete as perdas de ATR na cana planta e na cana soca, por conta da antecipação de corte.

 

Foram 366 mil toneladas na cana planta e 640 mil toneladas sacrificadas na socas, representando uma perda de 3.089.177,99 quilos de ATR e 3.610.380.91 quilos de ATR, respectivamente, totalizando 6.699.558,90 equivalentes a 123 mil sacas de açúcar ou a uma receita de R$ 8 milhões.

 

Estratégias de Manejo Varietal: São diversas as razões que levam a empresa produtora de cana a incorrer  nesse problema: necessidade de liberar áreas para reforma, colheita de cana própria mais concentrada no início de safra, necessidade de colher um grande bloco com variedades de maturação diferente de uma só vez, antecipação de colheita recomendada pelo que se convencionou chamar de terceiro eixo, canaviais que receberam maturadores sem análise prévia de desenvolvimento da cana, liberação de área para aplicação de vinhaça, etc.

 

É claro que alguns desses itens somente podem ser ajustados em lavouras mais estabilizadas ou se realizarmos um detalhado planejamento de médio a longo prazo com base em Blocos de Colheita.

 

Estes, por sua vez, precisam ser cuidadosamente organizados para agrupar variedades com as mesmas características de maturação em diferentes ambientes de produção existentes nos Blocos.

 

Este planejamento tem inúmeras vantagens, sendo que as principais se referem a redução da movimentação de equipamentos na colheita, que proporciona a diminuição dos custos de CTT (Corte, Transbordo e Transporte) e a colheita de um melhor teor de açúcar na cana.

 

O planejamento é a alma dessa atividade, pois ele reúne todas as peças do tabuleiro, ou seja: características varietais, adaptabilidade das mesmas, os diferentes ambientes de produção, épocas de colheita determinadas para cada bloco, necessidade diária de cana, capacidade da frota, cana de fornecedores, áreas de reforma, formação de viveiros, etc.

 

Escolha de Variedades: Os ajustes começam na hora de se escolher uma variedade.

 

Vamos supor que a empresa já dividiu a lavoura em Blocos e que cada Bloco tem vários Ambientes de Produção que impedem o gestor de escolher e plantar uma única variedade, porque ela não se adapta em todos os locais.

 

Como então proceder? Vejamos este exemplo:

 

Área do mini bloco (ou Módulo de Produção): 254 hectares

Ambientes de produção:

  •  Ambiente A:- 80 ha
  • Ambiente C:- 73 ha
  •  Ambiente D:- 22 ha
  •  Ambiente E:- 79 ha

 

Época indicada para colheita: início de safra no Estado de São Paulo.

 

Nesse caso, temos que buscar variedades que se adaptem a cada um destes ambientes e que apresentem maturação precoce.

 

Existe uma grande variação na exigência de ambientes para cada uma das variedades precoces, que pode ser assim representada:

 

O conhecimento desta graduação de exigência de variedades a ambientes de produção é importantíssimo, pois permite se plantar em um único Bloco heterogêneo em ambientes, várias variedades que poderão ser colhidas ao mesmo tempo, por possuem a mesma característica de maturação.

 

Entretanto, quando se tratar de ambientes favoráveis, a tarefa é mais facilitada. Nesse caso, a escolha de qualquer das variedades indicadas, vai depender de sua capacidade de produzir mais cana por hectare. Para tanto, são necessárias análises direcionadas para produtividade agrícola.

 

Para o caso extremo do ambiente de mais baixa fertilidade, o ambiente E, não temos nenhuma opção segura. Para atender a esta necessidade, deve-se pensar em realizar nesta área, um manejo diferenciado e, se possível, usar uma fertilização mais generosa, usar torta ou outras técnicas como calcário no sulco, incorporação de palha com calcário e torta (ou estêrco de curral), doses mais altas de vinhaça pura localizada na linha (até duas passadas) podendo cobrir esta lacuna com variedades precoces, cuja exigência é em geral maior do que em variedades médias e tardias, mesmo no caso de variedades precoces com menores exigências em ambientes como RB85 5156 ou CTC9005.

 

Este indicativo de manejo exigirá maior gasto com insumos e tratos culturais, mas garantirá, no mínimo, o mesmo açúcar por hectare, que as demais precoces irão proporcionar. O fato de se cortar mais cedo possível, vai proporcionar às variedades mais exigentes um maior período de vegetação, como manda a regra do 3º eixo. Este fato pode viabilizar o manejo de precoces em solos menos férteis

 

É importante lembrar que esta estratégia para alocação de variedades é válida para todas as épocas de corte e variedades, pois tenta compatibilizar ao máximo a época de corte com a exigência e as características delas, visando sempre, colher o Bloco de uma só vez.

 

Algumas variedades de maturação média, quando “sacrificadas” em relação à época de corte (com antecipação no primeiro corte), podem, do segundo corte em diante antecipar a maturação, comportando-se como uma variedade “quase” precoce, com teores de sacarose semelhantes. Esta estratégia já foi muito utilizada com a SP81-3250 no passado, pois quando era antecipado o corte neste ano, no seguinte, antecipava a maturação.

 

Planejamento de viveirosConhecendo-se a Época de Corte que a logística estabeleceu para cada local e os Ambientes de Produção, pode-se escolher as variedades mais adaptadas para cada Modulo de Produção (ou minibloco como pode ser chamado também).

 

Assim, os viveiros poderão ser antecipadamente programados para os diversos ambientes, pelo menos, dois anos antes, facilitando o plantio das melhores opções varietais dentro ou ao lado das futuras áreas de reforma, reduzindo assim o custo de implantação dos novos canaviais.

 

A apuração do desempenho agrícola das variedades, seja por experimentos, banco de dados e por meio de visitas direcionadas com critérios para avaliação, permitirá ao planejador utilizar com maior segurança as variedades mais adequadas nos lugares certos e extrair o máximo delas.

Além disso, ensaios de competição de variedades subdivididos em pelo menos duas épocas de corte, poderão trazer as respostas que precisamos para maximização do resultado de manejo varietal em cada Bloco nos diversos Módulos de Produção que o compõem.

 

A tabela 2, a seguir, contem preciosas informações para utilização no manejo varietal, mas não possui tudo o que deve ser levado em conta, como por exemplo: florescimento, tombamento, velocidade de crescimento, respostas à fertilizações diferenciadas, respostas à irrigação, comportamento em regiões de clima mais frio, capacidade de brotação de soqueira sob palha, resistência à doenças depois de expandidas para grandes áreas, etc.

 

Tabela 2: Recomendações para manejo varietal

Recomendação para manejo varietal

 

Cada empresa produtora de cana-de-açúcar necessita obter sua própria tabela, com as variedades que estão se comportando melhor na região.

 

O comparativo com variedades comerciais mais antigas também deve ser merecer a atenção do gestor, uma vez que não se deve plantar qualquer Cultivar somente porque é novo. É necessário ter a comprovação de que o novo é superior. Recomendamos realizar algumas comparações antes da grande ampliação de área de plantio dos novos cultivares.

 

Análises de interações entre variáveis são muito importantes, no caso de uso do banco de dados, variedades podem ser comparadas entre si com razoável precisão, se o ambiente de produção, o estágio de corte e a época de corte fizerem parte da análise. Sugerimos que este último fato seja fixado para obter o desempenho de cada variedade em separado. Planilhas podem reunir os dados apurados para uma melhor comparação.

 

Nunca devemos nos esquecer que uma variedade plantada sem a devida avaliação, pode causar um prejuízo por cinco ou seis cortes. Expandir uma nova variedade é de enorme responsabilidade comparada a bater um pênalti com o placar empatado, numa final de campeonato, aos 45 minutos do segundo tempo. Erros não são admitidos.

 

Você, amigo produtor, já refletiu se está avaliando corretamente o desempenho das suas variedades comerciais?

 

A substituição de velhas variedades está sendo bem embasada?

 

Você tem um método adequado de apuração de desempenho varietal ou apenas segue a importante, porém não suficiente, recomendação dos pesquisadores?

 

Já subdividiu sua lavoura em Blocos e identificou os Módulos de Produção?

 

Nããããooo? Então corra, por que deve estar perdendo muita informação útil e principalmente muito dinheiro.

 

Mais uma vez: manejo varietal é uma ciência fascinante, que precisa de cuidado e principalmente INFORMAÇÃO.

 

Para atualizar profissionais do setor que trabalham com manejo varietal de cana-de-açúcar, o Grupo IDEA organiza, há quase 15 anos, o Grande Encontro sobre Variedades de Cana. 

 

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