Dúvidas no início da safra - Por Arnaldo Jardim
O governo federal precisa jogar aberto com o setor sucroenergético
Há uma dose contida de otimismo com o início da safra 2015/2016 de cana-de-açúcar no Centro-Sul do país. Aberta oficialmente em primeiro de abril com o início da moagem da cana já havia atividade nas menores usinas desde março. As chuvas que chegaram antes e a expectativa de um bom clima futuro deram um impulso na atividade.
Os empresários não fazem apostas. Já cansaram de jogar contra cartas marcadas e agora entendem que o governo federal precisa abrir o jogo e garantir a eficiência dos propósitos políticos. Mesmo porque os prognósticos são cautelosos. O próprio ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, reconhece os desafios para restabelecer o patamar adequado de rentabilidade nas usinas. Admite que devemos nos preparar para uma crise em 2025, quando o Brasil precisará importar 26 bilhões de litros de gasolina para abastecer o mercado interno. E sem garantia de etanol será difícil.
O crescimento da demanda por etanol hidratado nos últimos meses estimulou o aumento da produção do biocombustível, que até o momento apresentou crescimento de 35,15% na comparação com a safra passada. O ritmo de fabricação está semelhante ao de 2009 e poderemos ter uma produção mais “alcooleira”, como comentam os técnicos. Hoje já temos 250 empresas em atividade.
É a realidade. Estamos produzindo mais cana, mas a quantidade ainda será insuficiente para tocar as usinas a plena carga. As empresas estão resolvendo sua liquidez imediata com a produção e venda de etanol hidratado para que possam suportar os investimentos mais urgentes de produção. A volta da Cide na gasolina e os reajustes concedidos pelo governo mudaram a situação da safra passada para esta.
Retomar a capacidade operacional é o primeiro passo para que muitas usinas tenham esperanças de alguma recuperação financeira. A maior parte das empresas que solicitaram recuperação judicial já morreu na praia. Segundo a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), das 67 unidades em recuperação judicial no país, 44 estão paralisadas, sem gerar caixa.
Desde 2008, sob dívidas maiores do que seus faturamentos, as usinas de cana-de-açúcar se arrastam na crise das contradições como consequência dos grandes investimentos encorajados pelo governo federal para aumento da capacidade de produção, da contenção dos preços dos combustíveis no país e dos anos consecutivos de baixos preços mundiais do açúcar. Desde então, 80 usinas de cana fecharam as portas no Brasil. A crise atinge empregos, os setores de máquinas e equipamentos, os plantadores de cana e milhares de brasileiros que vivem nos municípios dependentes das atividades sucroenergéticas.
Mas não é tempo de esmorecer. Por isso relançamos em Brasília, no início de maio, a Frente Parlamentar pela Valorização do Setor Sucroenergético, agora presidida pelo deputado federal Sergio Souza (PMDB-PR). A frente suprapartidária, que coordenei desde o início, foi lançada em novembro de 2013 com o propósito de reunir toda a cadeia setorial; manter uma postura propositiva e o diálogo permanente com todas as áreas do Poder Executivo envolvidas na atividade, em articulação com a Organização das Cooperativas Brasileiras e a Frente Parlamentar Agropecuária.
Tivemos conquistas pontuais, como o aumento da adição de etanol à gasolina, a volta da Cide, a desoneração de Pis/Cofins e a inclusão do setor no programa Inovar-Auto. Mas todas elas precisam ser consolidadas. As liberações de recurso para a renovação dos canaviais (Pró-Renova) sofrem atrasos superiores a um ano. O Inovar-Auto não incentiva a melhora de desempenho dos motores flex (bicombustível) e ainda estamos longe de regras e incentivos consistentes para a produção de bioeletricidade de forma econômica e descentralizada.
O Brasil é o maior produtor mundial de cana-de-açúcar, com 400 unidades industriais e 70 mil produtores independentes de cana-de-açúcar, responsáveis pela geração de mais de um milhão de empregos diretos, distribuídos por cerca de 20% dos municípios brasileiros, e por um PIB de mais de US$ 40 bilhões e exportações anuais da ordem de US$ 15 bilhões.
O setor sucroenergético está incluído com vigor nos debates políticos e econômicos. Compareceu em todos os programas e campanhas das últimas eleições presidenciais e é reconhecido internacionalmente como um sucesso em pesquisa, produção e uso de etanol em larga escala com ganhos ambientais incontestáveis.
Só o governo federal, por anos e anos desta gestão, parece não se dar conta de que o Brasil precisa de uma política pública de energia e meio ambiente que eleja a produção de etanol e de bioeletricidade como prioridades da matriz de desenvolvimento do país.