Gestão sustentável da água - O Estado de S. Paulo
O agravamento da seca no Estado da Califórnia, que vem desde 2013, tornou insuficientes as multas de US$ 45 a US$ 500 em caso de desperdício de água. Foi preciso adotar um sério racionamento. O governador da Califórnia, Jerry Brown, acaba de determinar restrições obrigatórias ao uso da água, com o objetivo de reduzir o consumo em 25%, o que deve levar a uma economia de 1,8 trilhão de litros nos próximos nove meses. "Esse é o novo normal. E vamos aprender a lidar com ele", afirmou Brown.
A necessidade de um novo modo de lidar com a água não deve ficar restrita a regiões que enfrentam períodos de forte estiagem, como a Califórnia ou a cidade de São Paulo. É um desafio global, alerta a ONU. Em recente relatório da entidade, Água para um Mundo Sustentável, estima-se que, caso se mantenha o atual padrão de gestão da água, o planeta deve enfrentar até 2030 um déficit hídrico de até 40%. É urgente, portanto, um novo modo de usar e de gerenciar esse recurso vital, afirma a ONU.
Segundo o relatório, calcula-se que até 2050 a demanda por água crescerá 55%. Ao mesmo tempo, 20% das fontes de água subterrânea estão hiperexploradas. No norte da China, por exemplo, a irrigação intensa provocou um rebaixamento de 40 metros do lençol freático.
As mudanças climáticas agravam o problema. A elevação do nível do mar vem ameaçando os lençóis freáticos de áreas costeiras, com as reservas de água subterrânea contagiadas pela água do mar. O fenômeno já ocorre em Calcutá (Índia), Xangai (China) e Daca (Bangladesh), por exemplo.
As Nações Unidas apontam para uma relação complexa entre água e desenvolvimento econômico e social. A água é essencial para a redução da pobreza e atualmente 748 milhões de pessoas ainda não têm acesso a fontes de água potável. Mas, como se tem verificado em muitos casos, o próprio desenvolvimento econômico ameaça os recursos hídricos. Por exemplo, nos anos 60 do século passado, a Índia tinha menos de 1 milhão de poços. Em 2000, já eram quase 19 milhões de poços. Tal expansão tecnológica contribuiu para o desenvolvimento econômico e social do país, mas gerou também um grave estresse hídrico em algumas regiões da Índia, como Maharashtra e Rajastão. É necessário, portanto, encontrar um equilíbrio entre suprimento e demanda, afirma a ONU.
O relatório reconhece que a transição para modelos mais sustentáveis tem um custo, mas, se for bem planejada, pode significar um círculo virtuoso, no qual o valor investido na proteção de uma área de captação seja compensado pela economia no tratamento da água. Um exemplo é a cidade de Nova York, onde a gestão das áreas de captação gera uma economia anual de cerca de US$ 300 milhões.
A ONU enfatiza que uma governança mais sustentável da água é possível em todas as regiões do mundo, e não apenas nos países desenvolvidos. O relatório cita o caso de Phnom Penh, capital do Camboja, que no final dos anos 90 desperdiçava 60% da sua água. Em dez anos, conseguiu-se baixar esse porcentual para 6%.
Os casos de sucesso indicam, no entanto, a necessidade de um planejamento estratégico sério, o que habitualmente não ocorre, reconhece a ONU. Em geral, as autoridades públicas tomam decisões a partir de uma perspectiva de curto prazo, o que inviabiliza uma gestão sustentável dos recursos hídricos. É o caso, por exemplo, do preço. Para a ONU, a precificação da água precisa ser revista, pois o seu baixo preço atual desconsidera o custo real - que também deve englobar o impacto ambiental - e estimula desperdícios.
Diante desse panorama, a ONU trabalha para que um dos novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para 2030 - atualmente em fase de estudo - seja inteiramente dedicado à água, mas não apenas com foco na água potável e no saneamento, e sim na gestão mundial de todo o ciclo da água.
Que o País saiba aproveitar as recomendações da ONU. Afinal, sustentabilidade é responsabilidade. Com o presente e com o futuro.