Após a reunião do G20 em junho, no Japão, aparentemente um clima de mais otimismo voltou em relação à redução dos conflitos comerciais graças aos encontros pessoais dos líderes mundiais. Comenta-se, inclusive, das chances da China comprar mais produtos agro dos EUA, num gesto de boa vontade ou “goodwill” para as negociações avançarem. Mas são sinais trocados, pois a temperatura no comércio entre Índia e EUA também se elevou com a apresentação de tarifas pela Índia agora em 28 produtos dos EUA, atingindo maçãs, nozes, entre outros. O déficit americano com a Índia foi de US$ 21,3 bilhões em 2018. Para o nosso agronegócio esta criação de conflitos até agora representou oportunidade que vem sendo aproveitada. Economia mundial terá sua velocidade de crescimento baseada nestes acordos e disputas, temos que observar.
Para a economia brasileira, redução de velocidade, com o novo relatório Focus do Banco Central mais conservador derrubou de 1,13% para 1% o crescimento do PIB esperado para este ano e de 2,5% para 2,23% no próximo. A inflação também cai de 4,03% para 3,89% em 2019 e fica em 4% ano que vem. Selic esperada em 6,50% para o final de 2019 e 7% no final do ano que vem e, finalmente, o câmbio ficou em R$ 3,80 para dezembro deste ano e do próximo.
Pulando da economia ao agro, em relação aos grãos, a nova previsão da CONAB agora traz 238,9 milhões de toneladas para a safra 2018/19, quase 5% acima da safra anterior. A área plantada encostou em 63 milhões de hectares, praticamente 2% acima da área anterior. Agregamos 672,8 mil hectares de soja, 795,3 mil hectares de segunda safra de milho e 425 mil hectares de algodão. O maior aumento de produção observado é no milho, que chegará a 97 milhões de toneladas e a soja ficará bem próxima a 115 milhões. Este milho todo vem em boa hora com a possível perda de produção na recentemente plantada safra americana, o crescente uso para etanol no Brasil e a necessidade de se produzir mais ração para produzir as carnes no Brasil, devido às maiores importações da China e outros países do Sudeste Asiático, pois segue o problema da peste suína africana na China, com impactos ainda não exatamente quantificados, mas que serão grandes.
O último relatório do USDA sobre o andamento do plantio e safra nos EUA joga mais dúvidas ainda no mercado. O documento mostra um plantio de 10,3 milhões de acres a menos que a safra passada, e 6 milhões menor que a estimativa de março. Na avaliação de primeiro de julho, 56% do milho está em condições boas ou ótimas, contra 76% do ano passado. Quase 92% da soja foi plantada, quando nesta época do ano passado praticamente tudo havia sido semeado e 54% está em condições boas ou ótimas, contra 71% do ano passado. Com esta previsão, preços subiram e afetaram lá a competitividade do etanol de milho, com impacto positivo para a competitividade do etanol anidro do Centro Sul do Brasil no mercado do Nordeste e até para exportarmos mais.
Segundo estes documentos (USDA), para a safra 2019/20, os EUA exportarão 55 milhões de toneladas de milho, 3 milhões a menos, que serão capturadas pelos crescimentos do Brasil para 35 milhões de toneladas e da Argentina para 33,5 milhões. Termina por mostrar a importância do processamento de milho nos EUA para fazer etanol e DDG e a exportação destes produtos confere mais competitividade à cadeia. A União Europeia deve aumentar as importações este ano, devido ao fim de uma tarifa anti-dumping que existia desde 2012.
Em maio o nosso agro vendeu ao mundo US$ 9,8 bilhões, 1,2% a menos que o mesmo mês de 2018. As importações do agronegócio cresceram 9% atingindo US$ 1,2 bilhão, com isto o saldo ficou em US$ 8,6 bilhões, 2,2% menor. A soja desta vez não ajudou tanto, caindo 22% em valor, ficando em US$ 4,5 bilhões. Isto impediu de batermos recorde, pois as carnes cresceram quase 28% (total de US$ 1,4 bilhão, sendo frango US$ 650,4 milhões, bovina com US$ 573,3 milhões e suína com US$ 124,6 milhões), refletindo os efeitos da peste suína africana na China. Produtos florestais também tiveram grande crescimento, de 24% atingindo US$ 1,3 bilhão no mês. O café também cresceu quase 70%, atingindo US$ 438 milhões. Com a queda da soja, caíram também as importações chinesas em 21% (total de US$ 3,5 bilhões). Ano passado a China comprou 88 milhões de toneladas de soja, sendo quase 69 milhões do Brasil. Com isto o Brasil vendeu ao mundo seu recorde de 83,6 milhões de toneladas de soja, trazendo a fortuna de US$ 33 bilhões. Para este ano dificilmente chegaremos a 70 milhões de toneladas, o que deve trazer um tombo na receita de US$ 8,5 bilhões, em parte compensada pelo crescimento das outras cadeias produtivas.
Com o melhor desempenho das carnes no Brasil, o novo VBP (Valor Bruto da Produção do Ministério da Agricultura) deve ficar em R$ 601 bilhões. Isto é R$ 3,1 bilhões a mais que a projeção de maio (1,4% acima). Nas cinco principais cadeias da pecuária, o valor cresceu R$ 2,9 bilhões, atingindo R$ 202,3 bilhões. Nos 21 produtos agrícolas teremos praticamente o mesmo valor, quase R$ 399 bilhões. Destaca-se o grande crescimento de quase 18% para o milho, encostando nos R$ 58 bilhões. Eu acho que seguirá aumentando o VBP com os fatos do mercado mundial.
Em relação à safra vindoura, o Plano Safra recém-anunciado tem um valor de R$ 222,74 bilhões de créditos, sendo R$ 31,22 bilhões destinados ao Pronaf. Os juros ao redor de 8%. Trinta e seis bilhões serão contratados a taxas livres, estima-se que com taxas entre 8,5% a 11% ao ano. Há o anúncio também de R$ 1 bilhão para subsídios ao seguro rural.
O acordo entre Mercosul e União Europeia agitou o mês. Foram duas décadas de conversas, e não deixa de ser uma onda contrária aos movimentos protecionistas recentes, por isto foi bastante comentado na imprensa mundial. É um bloco de 720 milhões de pessoas e 25% do PIB mundial. De início, estima-se uma redução de tarifas de 4 bilhões de Euros à UE. Para a UE vai interessar mais os mercados de produtos manufaturados, entre eles carros, vinhos, queijos, além de contratos públicos. Para o Mercosul abre-se mais o mercado para frutas, suco de laranja, café, carnes, açúcar e etanol. A redução das tarifas é gradual, reduzindo os impactos imediatos, algumas levarão até 10 anos e no caso de carros, 15 anos.
Ainda precisa de aprovação dos países, o que pode levar muito tempo. Vai enfrentar muita resistência dos lobbies agrícolas europeus, bem como levantar preocupações e riscos ao Brasil na área ambiental. A UE estabeleceu cotas em alguns produtos mais sensíveis ao bloco. Na carne bovina uma cota de 99 mil toneladas com carcaça, no frango 180 mil toneladas com carcaça, na carne suína são 25 mil toneladas (tarifa de 83 euros por tonelada), no açúcar uma cota de 180 mil toneladas para o refinado, no etanol 200 mil toneladas para uso como combustível com 1/3 da tarifa e 450 mil para uso químico sem tarifa, 60 mil toneladas para o arroz, 45 mil toneladas para o mel, entre outros. São licenças que serão distribuídas de alguma forma pelo Governo Brasileiro, na cota que o couber dentro do Mercosul. Lembremos que perto das nossas exportações, são volumes muito pequenos. Temos sim que comemorar, mas a Ásia é muito mais importante.
Os cinco fatos do agro para acompanhar agora diariamente em julho são:
1) O mais importante: as primeiras estimativas do que será produzido nos EUA. Devido às chuvas excessivas é uma safra com risco maior;
2) Como serão os impactos da evolução da gripe suína africana na China nas importações e preços de carnes e grãos. Há percepções de que algo pode estar sendo escondido pelo Governo como também pode não ser tão grave. Grande incerteza.
3) As questões comerciais de China e EUA e se haverá mesmo gesto de boa vontade para aumentar a importação de alimentos dos EUA pela China visando acelerar as negociações, sendo este um risco ao Brasil;
4) A reforma da previdência no Brasil e os efeitos no câmbio;
5) Evoluções do acordo comercial Mercosul e União Europeia.
Estamos em um momento bom, com preços razoáveis em reais e boas produções.
Torcer para permanecer!
Marcos Fava Neves é Professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP em Ribeirão Preto e da EAESP/FGV em São Paulo, especialista em planejamento estratégico do agronegócio.