Lições essenciais - Por Arnaldo Luiz Corrêa

Lições essenciais - Por Arnaldo Luiz Corrêa

O mercado futuro de açúcar em NY se recuperou da queda das semanas anteriores e encerrou esta sexta-feira cotado a 19.69 centavos de dólar por libra-peso para o vencimento março/22, 94 pontos de alta em relação à semana anterior, pouco mais de 20 dólares por tonelada.

A inflação americana é uma espada na cabeça da economia global. O país apurou no mês de novembro a maior inflação dos últimos 40 anos: 6.8% no acumulado de doze meses (dezembro/20 até novembro/21), liderada principalmente pela energia, que subiu 33.3%, veículos novos 11.1% e vestuário 5.0%.

Aqui no Brasil, 75% das instituições financeiras preveem que os juros estarão em 11.75% ou mais até o final de 2022. Juros em elevação, inflação em alta, PIB em queda e menor poder de compra das famílias devem impactar fortemente o consumo de alimentos, bebidas e combustíveis, para ficarmos apenas nos itens que afetam diretamente o nosso setor.

Para piorar o cenário, a eleição presidencial de 2022 vai trazer enorme desgaste à moeda brasileira pela característica deletéria dos dois principais postulantes, dificultando além de tudo a tomada de decisão nas usinas acerca do mix de produção e a sensibilidade do momento adequado de se proteger. Explico mais adiante.

A elevação do custo de produção do açúcar posto usina em um ano ultrapassou 40%, nível inimaginável até mesmo para o mais pessimista dos executivos. Em dezembro do ano passado, portanto a quatro meses do início dessa safra corrente, as usinas já tinham fixado cerca de 70% do volume de açúcar destinado à exportação cujo preço médio chegara a R$ 1,580 por tonelada FOB, valor que era considerado remunerador tendo em vista a estrutura de custos vigentes na época. Naquele mês, o dólar médio foi de R$ 5,1462 e o petróleo Brent negociava na média o equivalente a R$ 258,42 o barril. De abril até novembro deste ano, o dólar médio apurado é de R$ 5,3326 enquanto o Brent médio atingiu R$ 395,00 o barril.

Criticando retrospectivamente, o que poderia ter sido feito? Bem, nossa orientação para os clientes em agosto de 2020 – quando o percentual de fixação de preços para esta safra estava inferior a 25% – era a de fixar preços em reais, que naquele momento mostrava R$ 1,522 por tonelada e, concomitantemente, comprar uma call (opção de compra) de preço de exercício de 14 centavos de dólar por libra-peso, ao custo de R$ 85 por tonelada (5.6% do valor da fixação), ou pelo menos fazer 40% do volume fixado. Caso tivesse optado pelo seguro integral, essa opção encerrou na sexta-feira ao equivalente a R$ 704,14 por tonelada o que transformaria a fixação em R$ 2,141 por tonelada. Se optasse por 40% apenas, o valor fixado final seria de R$ 1,770 por tonelada.

Em função da perda de oportunidades por ter fixado o açúcar antes – como se alguém tivesse bola de cristal para saber o futuro – e por não ter coberto alguns riscos que naquele momento pareciam improváveis, a reação das usinas este ano foi de diminuir o volume das fixações de preço para a safra seguinte. Tanto é que o número divulgado pela Archer Consulting na semana apontava que a safra 22/23 está 47.6% fixada até o final de novembro, comparada com 61.3% no mesmo período do ano passado.

Volto à questão do mix. Olhando o cenário do momento, tudo indica que no ano que vem as usinas deverão priorizar a produção de açúcar. Essa percepção é completamente oposta a que discutíamos aqui há alguns meses. A expectativa de recuperação da economia global, aliada ao vigor até então demonstrado pelo mercado do petróleo anteviam preços mais altos da gasolina que associada a um real fraco frente ao dólar iria ascender o preço do hidratado tornando difícil para o açúcar igualar a rentabilidade. Assim, era claro assumir que as usinas iriam priorizar o etanol.

No entanto, novos elementos entraram na equação. Inflação subindo, nova cepa do coronavirus, juros em ascensão, diminuição do entusiasmo em relação à mobilidade (turismo, viagens), menos otimismo em relação ao consumo global, entre as principais variantes. O mercado interno do hidratado que chegara a bater R$ 3,8900 caiu no vazio para R$ 3,3200 o litro, sem impostos. As usinas ficaram em alerta.

O consumo interno de açúcar também derrapa. Indústrias de alimentos e bebidas não tem pressa alguma em antecipar compras nem formar estoques. O consumo – dizem elas – cai e “estamos trabalhando da mão para a boca”, que no jargão do mercado significa comprar a matéria prima à medida que a demanda pelo produto final caminha. O custo de carregar estoque passa a ter enorme impacto com os juros a 9.25% ao ano.

Lições precisam ser aprendidas, conceitos precisam ser revistos, a habilidade de diferenciar o que é custo e valor precisa ser praticada (alguns hedgers teimam em não comprar seguros pelo impacto no caixa) e o pleno domínio da gestão de risco precisa ser fortalecido. Esses são os elementos-chave para a consolidação de uma politica de risco adequada que agregue valor aos acionistas. O ano que vem vai exigir ainda mais do corpo diretivo das empresas.

 

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