Mais-valia da cana-energia – por Roberto Rodrigues

Mais-valia da cana-energia – por Roberto Rodrigues

O recente aumento dos preços dos combustíveis fósseis não foi suficiente para resolver os problemas de caixa da Petrobras nem deu melhores condições ao etanol. Economistas de peso têm mostrado a grande vantagem de resgatar a Cide sobre a gasolina.
Em primeiro lugar, é uma taxa que já existe, que foi zerada no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff e apenas parcialmente recuperada em março deste ano. Portanto, não necessita ser aprovada ou votada no Congresso Nacional. Isso daria competitividade ao etanol, mostrando que o Brasil nâo teria jogado fora o maior, mais importante e mais admirado programa global de alternativa energética (renovável e ambientalmente superior) desde a crise do petróleo, em 1974/75. Por outro lado, seria uma injeção direta de recursos no Tesouro, sem a oposição que existe em torno da volta da CPMF. Por fim, seria o reconhecimento das externalidades do etanol para a saúde pública e o meio ambiente, cantadas e decantadas em todo o mundo. E ainda salvaria um setor que gera empregos e economiza divisas.
Não existe nenhuma explicação plausível para essa teimosia do governo em não aumentar a Cide. Nem mesmo o eventual aumento da inflação, sempre levantado, serve como argumento, de acordo com o que dizem respeitados analistas.
Independentemente dessa questão, entretanto, o setor sucroenergético, que vem naufragando desde que o governo segurou os preços da gasolina, para frear a inflação nos quatro anos passados, precisa investir em avanços tecnológicos para encontrar outras formas de sobrevivência e progresso. E já existem muitas inovações, tanto na área agrícola quanto na industrial. Novos equipamentos de plantio e colheita são aperfeiçoados para evitar perdas ou má brotação das soqueiras; entram no mercado fórmulas especiais de adubação com nutrientes mais bem calibrados; e estudos são desenvolvidos para obter o melhor espaçamento entre ruas de cana e perfilhamento das plantas, e assim por diante.
Mas uma das mais extraordinárias novidades é a chamada "cana-energia". Acontece que, contrariamente a diversas culturas - soja, milho, algodão, entre outras -, cujas novas variedades são sistemática e rapidamente desenvolvidas com maior produtividade e adaptabilidade às áreas de cultivo, a produtividade da cana-de-açúcar, que teve grandes avanços nos anos 70 do século passado, estagnou na última década. Está difícil superar a média de 85/90 toneladas por hectare em quatro ou cinco cortes.
Pois a cana-energia surge como uma resposta impressionante a essa necessidade. Com maior participação da S. Spontaneum nos cruzamentos com a S. Offici-narum, ela facilmente supera as 100 toneladas por hectare. Além disso, a cana-energia tem um sistema radicular muito mais forte do que as variedades hoje cultivadas, de modo que tem muito maior brotação das socas, o que lhe dá uma vida útil mais longa e melhor resistência a secas eventuais. Isso também permite o seu cultivo em regiões com menor pluviosidade que aquelas atualmente utilizadas em canaviais. E tem mais: com a cogeraçâo de eletricidade a partir da biomassa de bagaço e palha, a cana-energia se torna uma alternativa agrícola muito melhor, notadamente com o avanço do etanol de segunda geração. Com seu uso, as atuais usinas de açúcar e álcool se transformarão em biorrefinarias modernas e competitivas, produzindo uma gama de novos produtos de maior valor agregado.
Cide e cana-energia, eis o binômio para a recuperação do setor sucroenergético: uma política pública e uma ação técnico-empresarial.
Artigo publicado originalmente na Revista Globo Rural, edição de Novembro de 2015.
 
Roberto Rodrigues: Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio (Cosag) da Federação das Indústrias do Estado de SP (Fiesp) e ex-ministro da Agricultura