Muita coisa para digerir – Por Arnaldo Luiz Corrêa

Muita coisa para digerir – Por Arnaldo Luiz Corrêa

O mercado de açúcar em NY começou a semana reagindo negativamente à posição dos fundos e chegou a se desvalorizar em 69 pontos em relação ao fechamento da sexta-feira anterior. Os fundos não tiveram uma doce experiência com o açúcar na recente alta, momento em que aumentaram suas posições num mercado que declinava sob forte influência do início de safra no Centro-Sul e pela volatilidade da moeda brasileira causada pela instabilidade política no Brasil. Muitos ingredientes para digerir.
É fato que, como disséramos aqui há algumas semanas, o mercado físico estava divorciado do mercado futuro quando este subiu estrondosamente 400 pontos de 23 de fevereiro a 22 de março. Nossa observação era que faltava ao mercado futuro a validação, por parte do mercado físico, de sua pujança. Ora, isso não ocorreu, e os fundamentos de longo prazo não foram suficientes para atuar sobre a realidade do mercado físico que continuou anêmico e prejudicado pelo derretimento do preço do etanol neste início de safra. Além do mais, a maneira mais rápida de fazer caixa para as usinas é vender etanol. A pressão foi grande: os valores negociados de hidratado e anidro hoje estão a desconto do preço do açúcar em NY.
A boa notícia é que parece que o etanol parou de cair. Depois de ter negociado a R$ 1,3000 por litro, equivalente a um desconto de 260 pontos em relação ao açúcar de NY, recuperou-se ligeiramente. Um executivo do setor acredita que com os preços menores ao consumidor, o hidratado volta a ganhar competitividade na bomba permitindo a reconquista do mercado que já pendia para a gasolina e pode, segundo ele, adicionar 200 milhões de litros mensais à demanda.
NY assistiu a uma semana bastante volátil. Esperávamos que essa grande volatilidade ocorresse conforme antecipáramos aqui no último comentário, mas certamente o mercado se superou no quesito oscilação. O maio/2016 fechou a sexta-feira cotado a 15.04 centavos de dólar por libra-peso depois de ter negociado a mínima de 14.00 quarta-feira e a máxima na mesma sexta-feira a 15.12 centavos de dólar por libra-peso. Em 5 dias de pregão a volatilidade anualizada da semana traduz-se em 57.84%. Há tempos não víamos tal oscilação. Excetuando-se o final de fevereiro que também foi altamente volátil, a última vez que tivemos alta volatilidade em curto espaço de tempo foi em novembro do ano passado.
Algumas peças não se encaixam no quebra-cabeça maluco em que se transformou o mercado de açúcar nas últimas semanas. Ninguém duvida do déficit mundial que se avizinha e cujo tamanho, dependendo da fonte, está entre 4.7 e 11.4 milhões de toneladas, o primeiro depois de cinco anos de sucessivos superávits. Por outro lado, o mercado de açúcar FOB no curto prazo está tão largado às traças que basta olhar o tamanho do desconto que se dá para o vencimento outubro/2016 em relação ao março/2017, um spread de 76 pontos, equivalentes a um desconto de 7.50% ao ano. Então fica assim combinado: todos nós sabemos do déficit, mas não estamos nem aí para ele. Parece que assim que o mercado está tratando a situação.
A trading britânica Czarnikow, por outro lado, aumentou o déficit global de açúcar para a safra mundial de 2015/2016 (que iniciou em outubro de 2015 e vai até setembro deste ano) para 11.4 milhões de toneladas, o segundo maior da história. Esse número representa um acréscimo de 3.2 milhões de toneladas de sua ultima projeção. A estiagem nas regiões produtoras da Índia (1.4 milhão de toneladas) e da Tailândia (1.7 milhão de toneladas) é a grande responsável por esse aumento no déficit global.
O saldo da semana, no final, acabou sendo positivo com o vencimento maio/2016 apreciando 35 pontos (7.72 dólares por tonelada) e dos demais meses ao longo da curva até o vencimento março/2019 valorizaram entre 3.50 e 7.00 dólares por tonelada. Vale notar que o preço médio em reais por tonelada dos vencimentos correspondentes à safra 2016/2017 do Centro-Sul e suas respectivas taxas de câmbio fecharam na média de R$ 1.300 por tonelada.
O que pode estar por trás da recuperação do açúcar nesta sexta-feira? Será a possibilidade de impeachment da presidente Dilma Rousseff que – segundo alguns analistas – pode fazer com que o real se valorize até 3.2000? Será que as usinas estão bem fixadas a ponto de mesmo havendo um rally (subida acentuada de preços) como o de sexta-feira, não atraiu vendas por parte do Centro-Sul que atenuassem o apetite dos compradores?  Teremos visto a mínima do mercado e agora vamos mudar de patamar? Os fundos estão comprados em 174.000 lotes baseado na posição de terça-feira. De lá para cá o mercado subiu 100 pontos. Como estarão os fundos agora?
Para esse mercado continuar sua trajetória de alta, embora ainda longe do recente 16.75 centavos de dólar por libra-peso, há necessidade que o mercado físico valide o futuro. Isso só vai ocorrer com o aumento da demanda que ainda não se apresentou e também – a melhor indicação de todas – o fortalecimento dos spreads que refletem o posicionamento do livro das tradings em função da demanda que elas esperam do físico. Por enquanto, não é isso que estamos vendo. E já estamos soando como um disco quebrado.
Apenas para esclarecer alguns e-mails que recebemos, o valor da gasolina no mercado internacional aponta um preço médio ao consumidor (num levantamento feito com 100 países) de US$ 0.99 por litro, equivalendo a R$ 3.2550 por litro no Brasil (levando em consideração a mistura de 27% de anidro) e colocaria o preço justo do hidratado em R$ 2.2750 por litro, na equivalência do mercado internacional. Em suma, diferentemente do que se ouve na imprensa, que chegou a informar que o valor da gasolina no país estaria 40% acima do mercado internacional, em verdade está apenas 12%.
Na segunda-feira, o Brasil deve acordar com novo presidente. A perspectiva hoje é de que já existe maioria de 2/3 na Câmara para o impeachment da presidente Dilma Rousseff, a pior presidente da história do Brasil desde Hermes da Fonseca que foi considerado, apenas dois anos após a posse, “uma nulidade”. Dilma superou Hermes, pouco mais de 100 anos depois, agregando outras “qualidades” à do citado presidente. O bom é que pela primeira vez em 14 anos finalmente o Brasil vai ter um presidente que fala português. A crise política, no entanto, está longe de terminar apenas com o impeachment.
Arnaldo Luiz Corrêa é diretor da Archer Consulting