O clima e os desafios para a produção agrícola no Brasil - Por Desirée Brandt

O clima e os desafios para a produção agrícola no Brasil - Por Desirée Brandt

O ano de 2024 se inicia com um desafio imposto pelas condições climáticas ao agronegócio brasileiro. Sob o efeito do fenômeno climático El Niño, a safra de verão, que normalmente ocorre entre outubro e janeiro, está atrasada. Com o calendário agrícola mais apertado, a chamada ‘safrinha’ tende a sofrer fortes impactos.

Um atraso de 45 dias no regime de chuvas no começo do período de plantio da safra de verão obrigou agricultores de vários Estados produtores de grãos a realizarem o replantio. Sem contar com as precipitações no tempo certo, as sementes lançadas ao solo não vingaram por falta de umidade.

Em alguns lugares, houve replantio mais de uma vez. Essa situação afetou o ritmo da produção em importantíssimas áreas produtoras do Sudeste, Centro-Oeste e no Matopiba.

No Sul, com o término do vazio sanitário no Rio Grande do Sul — período em que é proibido cultivar ou manter plantas vivas de soja –, os agricultores não puderam dar início à plantação de grãos. Na região, muitas áreas de cultura de inverno ainda estavam sob as águas, um reflexo dos alagamentos provocados pelas fortes chuvas ocorridas nessa localidade.

Dados recentes da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), mostram que a produção brasileira de grãos na safra 2023/24 deve chegar a 306,4 milhões de toneladas e registrar uma redução de 13,5 milhões de toneladas em relação à safra anterior.

Segundo o órgão, as condições climáticas instáveis, com chuvas escassas e mal distribuídas, altas temperaturas na região central do País e precipitações volumosas no Sul, atrasaram o plantio e devem impactar a produtividade.

Para se ter uma ideia, a complexidade proporcionada pelas condições climáticas no Brasil dificulta inclusive uma previsão mais precisa da própria produção agrícola.

Com o atraso no timing da safra de verão, que ainda está transcorrendo, a ‘safrinha’ está sob risco. O tempo para a realização da safra poderá ficar bastante reduzido por conta da colheita atrasada. Soma-se a esse contexto os efeitos do próprio El Niño, que continuará a atuar nos próximos meses, ainda que o fenômeno perca força.

Acontece que, em anos de El Niño, normalmente se amplia a possibilidade de uma antecipação do período seco. Se isso ocorrer, a janela para o aproveitamento da umidade para uma safrinha poderá ficar ainda mais reduzida, comprometendo a produção.

Projeções
Os cultivos de inverno também tendem a trazer desafios impostos pelas condições climáticas, ainda que diferenciados em relação ao que se prevê para a safrinha. Ainda não há previsões que indiquem, categoricamente, a possibilidade de uma geada, por exemplo.

Mas ocorre que os modelos estão apontando para a possibilidade de ocorrência de um inverno de neutralidade – ou seja, sem o El Niño vigente e ainda sem a presença do La Niña, que de acordo com o último relatório do NOAA, irá se manifestar ao longo do segundo semestre de 2024.

Em situações como essa, mesmo que de forma mais esporádica, as massas de ar polar costumam avançar de forma mais continental e isso as tornam com grande potencial para queda acentuada na temperatura, com risco maior para ocorrência de geadas em áreas produtoras do centro e sul do país.

Então, sigamos atentos para as análises meteorológicas das condições climáticas no Brasil ao longo deste 2024 que apenas começou.

*Desirée Brandt é meteorologista e sócia executiva na Nottus

 

Globo Rural