O futuro bate à porta - Por Arnaldo Luiz Côrrea

O futuro bate à porta - Por Arnaldo Luiz Côrrea

O mercado futuro de açúcar em NY fechou a semana cotado a 14.15 centavos de dólar por libra-peso, 47 pontos de alta na semana.
 
Pode levar ainda algum tempo para o mercado de açúcar se acostumar com a nova política de formação de preços dos combustíveis adotada pela Petrobras, na gestão de Pedro Parente. Se a nova abordagem da estatal brasileira do petróleo der sinais de que veio para ficar,  trará enormes benefícios ao setor no médio e longo prazos. Há muitos anos, nesse espaço, quando levantávamos o assunto de que o preço da gasolina no Brasil deveria seguir o mercado internacional pois só assim haveria espaço para a expansão do setor de maneira sustentável, um executivo do setor à época, alertava: "esqueça, isso nunca vai acontecer". Não ocorreu mesmo. E ainda foi pior. 
 
Nos desastrosos anos protagonizados pelos governos do PT, tanto Lula quanto seu poste de estimação deram uma banana para o setor sucroalcooleiro após a descoberta do pré-sal. Subsidiaram o preço da gasolina ao consumidor seguindo à risca o marketing político populista, congelando-o e pisando no pescoço da indústria que dividiu a conta com o contribuinte brasileiro (via destruição e roubalheira na Petrobras). Em uma década o setor perdeu dinheiro, competitividade, encolheu e aumentou o endividamento das usinas na proporção inversa da queda da CIDE administrada por Dilma, que nutria pelo setor a mesma simpatia que nós sentimos pelos bichos peçonhentos. 
 
A quadrilha petista que acampou no planalto por treze anos é responsável entre outras mazelas, pelo encolhimento da participação do etanol na matriz energética que chegou a ser de 54.5% (hoje está em 44.5%) e numa perda de receita apenas no governo paquidérmico de Dilma, de mais de R$ 100 bilhões. Por isso, quando vemos um executivo competente e conhecedor do livre mercado como Pedro Parente, não há como não ficar contente (a rima não foi intencional).
 
O primeiro benefício dessa nova abordagem da Petrobras é a transparência. O setor viveu por muitos anos produzindo um produto (etanol) cujo preço de venda não guardava nenhuma relação com o açúcar nem tampouco com o petróleo. Mais da metade de toda a cana moída no país dependia de um produto (gasolina) cujo preço era administrado pelo governo. Sem possibilidade alguma de proteger custo ou margem, para o produtor cana era uma loteria. Menos de 1/3 do total da cana moída no país, aquela que  se destinava à produção de açúcar para exportação, podia efetivamente ter seu preço protegido por meio de hedge no mercado futuro de NY. Difícil administrar uma commodity dessa natureza. Veja o caso do complexo soja, no caminho inverso ao percorrido pela cana: tanto o grão quanto o farelo e o óleo são amplamente negociados na bolsa de Chicago. Eventuais desequilíbrios na oferta e demanda de qualquer um dos produtos são imediatamente refletidos em toda a cadeia, abrindo oportunidades de hedge e arbitragem para os produtores e processador mais engajados com a gestão de risco. 
 
O segundo benefício é a possibilidade de, finalmente, açúcar e etanol serem vasos comunicantes, propiciando oportunidades de arbitragem e hedge num futuro não muito distante. Tão logo essa política moderna de formação de preço se enraíze e ganhe credibilidade dos participantes do mercado, as usinas poderão hedgear o preço do etanol hidratado via cross-hedging, utilizando a curva de preços nos mercados futuros do RBOB ou do petróleo combinados com NDF, diminuindo volatilidade e abrindo espaço até mesmo para o hedge do mix. Não faltarão produtos derivativos referenciados nas bolsas e oferecidos em reais. O contrato de etanol na B3 (ex-BM&FBovespa) tem aí uma enorme oportunidade de finalmente virar referência. 
 
Pode ser que essa pequena mudança ainda não tenha sido totalmente digerida pelo mercado. Pode até ser que alguns mais desconfiados entendam como nociva, mas ouso acreditar que pode estar um curso uma mudança significativa de como vamos gerir o negócio cana nos próximos anos. 
 
Podemos estar diante de uma importante transformação e rara oportunidade para fazer com que a cana seja uma commodity na acepção da palavras, da mesma forma como o complexo soja se tornou. Cabe às usinas, no entanto, a tarefa inadiável de se modernizarem, olharem de maneira profissional à gestão de risco. Não há mais espaço para especulações travestidas de hedge, nem achar que existem vantagens sem a contrapartida. Nem acreditar que existe almoço de graça. Quem não investir em conhecimento vai comer poeira. O futuro bateu à sua porta. 
 
Para esfriar um poucos os ânimos, Andy Hall, um dos maiores traders de petróleo do mundo, conhecido por ter ganho muito dinheiro no mercado e por ter previsto corretamente a trajetória de preços da commodity, disse estar descrente de uma possível recuperação dos preços.