Nos fatos da arena internacional, destes últimos 30 dias, cabe destacar as projeções do USDA para os estoques de grãos dos EUA, que na segunda-feira (30/9) vieram 7% menores para a soja (quase 25 milhões de toneladas) e também mais baixos para o milho, surpreendendo e jogando os mercados para cima. Fora isso, na safra atual existem, ainda, duas preocupações: apenas 55% das lavouras de soja estão em boas ou ótimas condições e no milho 57%; a colheita está atrasada devido ao plantio mais tardio (na soja 7% colhidos, contra média de 20% para a data atual e no milho 11% contra 19% na média dos últimos 5 anos); o risco que se corre agora nos EUA é a chamada “earlyfrost”, ou geadas, que podem afetar principalmente Wisconsin e Minnesota. Estou há duas semanas na Universidade de Purdue, Indiana, e não vi otimismo com os produtores que conversei. Estes anos de crise aumentaram bastante o número de recuperações judiciais em fazendeiros americanos, devido a todos os problemas enfrentados.
O conflito com a China não fez os EUA parar seus movimentos e com o Japão negociam um acordo que afeta o Brasil na área agro. Deve contemplar carnes, frutas, cereais e etanol, dentre outros produtos. Com a isenção ou redução de tarifas, a oferta americana fica mais competitiva. São de aproximadamente US$ 14 bilhões as importações pelo Japão de produtos do agro americano, praticamente US$ 5 bilhões são isentos e o acordo contempla US$ 7 bilhões que têm impostos.
Mudando da América para a Ásia, de acordo com a ONU, 6,23 milhões de suínos em países asiáticos foram abatidos devido à peste suína africana. O pior caso é no Vietnam. Dados da ONU são os oficiais divulgados por cada país, por isso a situação pode ser provavelmente muito pior do que está. A China está consumindo os estoques estratégicos de carne em boa velocidade e a Rússia também reportou caso de febre suína africana.
No Brasil, seguimos com boas notícias. A última estimativa de setembro da CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento), mostra que teremos 242,1 milhões de toneladas de grãos, 6,4% acima da anterior, produzidos em 63,2 milhões de hectares. Em dez anos a área plantada no Brasil aumentou 2,3% ao ano e a produção aumentou 5,3% ao ano, graças a grandes ganhos de produtividade. O destaque foi o algodão que teve aumento de 36% na produção desta safra. A soja teve crescimento de 2,1% na área, mas a produção caiu 3,6% devido aos problemas climáticos de janeiro. No milho, chegaremos praticamente a 100 milhões de toneladas, com uma bela segunda safra. Enfim, aqui nos resta um parabéns aos produtores e agradecimentos ao clima. Preços continuam razoavelmente bons em reais.
Essa produção toda traz nova estimativa do Valor Bruto da Produção (VBP), agora em de R$ 601,9 bilhões, com queda deR$ 1,5 bilhão da projeção anterior, mas está quase 2% acima do ano passado. Os produtos agrícolas ficam com R$ 394,8 bilhões, cerca de 1% menor que o ano passado e a pecuária com R$ 207,2 bilhões, praticamente 7% acima do ano passado. Caso a soja mantivesse o desempenho do ano passado teríamos um número bem maior, é só imaginar as 3 ou 4 milhões de toneladas perdidas com a seca multiplicadas pelo valor do produto.
Como a China reduziu muito suas compras em agosto, nossas exportações do agro tiveram tombo. Foram de US$ 8,3 bilhões, 11% menos que em agosto de 2018. As importações recuaram 6,1% e o superávit foi de US$ 7,2 bilhões, 1,7% menor. Essa queda é explicada, principalmente, pela soja, pois vendemos 39% a menos, ou cerca de US$ 2,4 bilhões. Na conta dos cereais, farinhas e preparações, na qual se encaixa o milho, as vendas foram de US$ 1,4 bilhão (155,1% maiores). As carnes inexplicavelmente sofreram queda de 11,6%, vendendo US$ 1,3 bilhão (carne bovina US$ 618,3 milhões, queda de 11,6%, carne de frango US$ 544,4 milhões, queda de 11,8% e carne suína US$ 107,2 milhões, queda de 1,7%). Esperava que fossem aumentar devido ao problema da febre suína. Os produtos florestais também caíram 18%, ficando em US$ 971,8 milhões. O café cresceu 7%, chegando a US$ 403,9 milhões.
Essa menor performance de agosto colaborou para que neste ano estejamos 5,4% abaixo do ano passado, exportando o total de US$ 64,6 bilhões. As importações caíram 2,6%, totalizando US$ 9,2 bilhões, e com isto caímos para US$ 55,3 bilhões de superávit (4,2% menor na comparação com janeiro a agosto de 2018). A menos que a China entre comprando pesado, e as carnes apresentem grande reação, não conseguiremos igualar o ano passado, o que não deixa de ser decepcionante.
Entre as diversificações interessantes do agro brasileiro, segue crescendo a oportunidade do etanol de milho. Projeções da União Nacional do Etanol de Milho (Unem) mostram que devemos produzir ao redor de 2 bilhões de litros agora em 2020 e 8 bilhões de litros na safra 2028/29. Este ano deve fechar em 850 milhões de litros vindos de pouco mais de 2 milhões de toneladas de milho. A UNEM estima que em 2020 serão processados 6,2 milhões de toneladas. A área de eucalipto para abastecer de energia as unidades industriais que não dispõem de bagaço de cana pode chegar a 300 mil hectares, ou seja, um mar de oportunidades de investimentos.
Belo material foi preparado pela FIESP durante a crise na área ambiental. Mostra que o Brasil tem 45% da matriz energética (inclui todas as fontes) vinda de fontes renováveis de energia, contra uma média de 14% no mundo e os da OCDE cerca de 10%. Ainda bem que a situação da Amazônia foi acalmada no mundo, este ponto precisa ser monitorado de perto e a boa governança e a boa comunicação prevalecer.
É necessário monitorar de perto também as propostas de reforma tributária para entender que impactos isto teria nas cadeias produtivas do agronegócio. A implantação do Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS), que substituiria ICMS, IPI, ISS, PIS e Cofins precisa ser entendida, principalmente com relação à exportação de produtos e impactos inflacionários. Outros estados também ameaçando aumentar tributos sobre o agronegócio são pontos de preocupação.
Os cinco fatos do agro para acompanhar agora diariamente em outubro são:
1) O início do plantio da nossa safra e o comportamento do clima. Já estamos atrasados em algumas regiões, e a preocupação cresce;
2) O fechamento da safra dos EUA e o andamento da colheita, com os riscos climáticos ainda existindo nesta fase final;
3) As novas estimativas de impacto da peste suína africana na Ásia e nos preços e quantidades de carnes importadas neste último trimestre do ano;
4) As questões comerciais de China e EUA, que aparentemente pouco caminharam neste mês em direção a acordo, apesar de aumentos nas exportações americanas;
5) O andamento das reformas da previdência e agora o da tributária e seus impactos no agro, seja no câmbio, seja em outros tributos.
Marcos Fava Neves, Professor Titular das Faculdades de Administração da USP em Ribeirão Preto e da EAESP/FGV em São Paulo, especialista em planejamento estratégico do agronegócio