Seguem nossas reflexões dos fatos e números da cana em setembro/outubro e o que acompanhar em novembro. Na cana, a moagem acumulada de cana-de-açúcar na safra 2021/22 até 01 de outubro na região Centro Sul está em 467,44 milhões de t, contra 501,88 milhões de t no mesmo período do ciclo passado (-6,8%); dados são da União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica). Até a referida data, 36 unidades produtivas já encerraram a safra, enquanto outras 225 permanecem em operação. Até o final da primeira quinzena de outubro, outras 52 unidades já programam finalizar suas atividades.
No acompanhamento da produtividade dos canaviais feita pelo Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), o resultado para o mês de setembro foi de 58,2 t por hectare, uma queda de 21,0% em comparação com o mesmo mês do ano passado (era de 74,0 t por hectare).
Para o próximo ciclo, analistas esperam um consumo de 32,3 bilhões de litros de etanol (consumo interno + exportações), sendo que 29 bilhões seriam produzidos por meio da cana-de-açúcar e outros 3 bilhões advindos do biocombustível à base de milho. Considerando que a próxima safra também pode apresentar uma redução na oferta de cana para moagem (não comparada ao ciclo atual, mas já há indícios de queda), a oferta de açúcar pode ser comprometida, elevando ainda mais os preços no mercado global, já que o Brasil é o maior produtor da commodity.
A trading inglesa Czarnikow divulgou suas primeiras estimativas para a safra 2022/23 de cana-de-açúcar na região Centro-Sul do Brasil. Segundo a trading, 540 milhões de t serão moídas no próximo ciclo (+3,8%), produzindo 32,9 milhões de t de açúcar (+1,2%) e 23,8 bilhões de litros de etanol (+0,8%). Assim, o mix de açúcar deve ficar em cerca de 46,0% para açúcar e a produtividade em ATR (Açúcar Total Recuperável) deve atingir 139 kg/t (-2,7%). Os valores estimados levam em consideração novas ocorrências de eventos climáticos (destaque para seca) neste ciclo.
Recentemente, a Cosan tornou-se investidora do Fifth Wall Climate Tech, uma venture capital dos Estados Unidos, voltada a soluções para descarbonização do setor de combustíveis e energia. A ação do grupo tem como objetivo o acesso preferencial a tecnologias e startups voltadas à baixa emissão de carbono.
O governo do maior estado produtor de açúcar na Índia, Uttar Pradesh, aumentou o preço que as usinas devem desembolsar para aquisição de cana-de-açúcar no ciclo 2021/22 em 7,9%, agora em 340 rúpias por 100 kg, equivalente a US$ 4,61 por libra-peso. Se trata do primeira elevação de preços nos últimos quatro anos e acontece um ano antes das eleições para assembleia estadual.
No açúcar, a produção na segunda quinzena de setembro foi 19,9% menor que a do mesmo período de 2020, somando 2,32 milhões de toneladas. No acumulado da safra 2021/22, 29,19 milhões de t do adoçante foram produzidas, contra 32,06 milhões de t no acumulado do ciclo passado, uma redução de 7,0% no período.
Nos preços, as cotações do açúcar nas últimas semanas na Bolsa de Nova York fecharam em torno de 20,30 centavos de dólar por libra-peso para contratos com vencimento em março de 2022; o que reflete forte valorização na commodity. Para as safras 2022/23 e 2023/24, as operações de NDF (Non-Deliverable Forward) chegaram em R$ 2,580 e R$ 2,429, respectivamente; preços bastante remuneradores.
Agora em relação à comercialização, de acordo com cálculos da Archer Consulting, até o dia 31 de agosto, 8,3 milhões de t de açúcar já estavam fixadas para o ciclo 2022/23, com preços médios de 15,37 centavos de dólar por libra-peso; convertidos para o FOB Santos, o preço da t estaria em R$ 1,950. A consultoria também calculou o custo médio de produção do adoçante na região Centro-Sul, com base em dados da Unica (produção e ATR), o que indicou um custo de R$ 71,22 por saca na usina; ou 13,00 centavos de dólar por libra-peso FOB Santos, sem polarização.
Em suas atualizações mais recentes, a trading Alvean prevê que o consumo global de açúcar deve crescer 1,2% em 2021/22, frente aos 0,7% de crescimento da safra anterior. Por outro lado, a oferta brasileira de açúcar deve ficar em torno de 32,5 milhões de t, em vista à safra menor neste ciclo, que deve fechar em 530 milhões de t de cana-de-açúcar moída. Como resultado, o déficit global deve duplicar neste período, podendo alcançar até 6 milhões de t.
Na Índia, a Alvean indica que os estoques tiveram queda de 46,7% em comparação com o ano passado; ao final de 2020, estavam em 15 milhões de t, e agora giram em torno de 8 milhões de t. A Alvean prevê, ainda, que a produção tailandesa de açúcar deverá ser de 9,5 milhões de t no ciclo 2021/22; 9,5% menor do que era esperado pelo mercado (10,5 milhões de t). Já na Austrália, a produção de açúcar deve fechar a safra 2021/22 em torno de 4,4 milhões de t, crescimento de 2,3% em comparação ao ciclo anterior, segundo o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Já as exportações devem apresentar ritmo maior de crescimento, de 6,9%, saltando para 3,63 milhões de t. A moagem de cana, por fim, deve fechar em torno de 31 milhões de t. Teremos menos açúcar no mundo.
No etanol, na segunda quinzena de setembro, a produção atingiu 847,02 milhões de litros, um crescimento de 8,2% em comparação com o mesmo período do ano passado. No acumulado, desde 1° de abril, já foram produzidos 22,79 bilhões de litros de etanol, sendo que 8,90 bilhões do tipo anidro (39,1%) e 13,89 bilhões do tipo hidratado (60,9%). Do total produzido até o momento, 1,65 bilhões de litros (7,2%) tiveram o milho como matéria-prima.
No mês de setembro, as usinas do Centro-Sul comercializaram 2,46 bilhões de litros de etanol, queda de 15,0% em relação ao mesmo mês do ciclo passado. Do total comercializado, 2,26 bilhões de litros (91,9%) foram internamente, e outros 194,45 milhões de litros (8,1%) foram exportados. No acumulado da safra 2021/22, as vendas do biocombustível somam 14,75 bilhões de litros, praticamente o mesmo volume registrado no ciclo anterior. Desse total, 13,92 bilhões de litros (94,4%) foram consumidos internamente e outros 929,06 milhões de litros (5,6%) foram comercializados com o mercado externo. No setor de combustíveis, o consumo parece estar voltando a normalidade. Segundo a ANP (Agência Nacional do Petróleo), o consumo de gasolina equivalente acumulado nos últimos doze meses (setembro de 2020 até agosto de 2021), cresceu cerca de 3,8%, o que simboliza a mesma taxa de crescimento anual no período pré-pandemia.
Os preços da gasolina comum estão mais competitivos que o do etanol em todos os estados brasileiros e no DF, segundo levantamento da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis). A paridade do etanol sobre a gasolina está em 78,05%, com preços médios de R$ 4,774/litro para o biocombustível e de R$ 6,177/litro para o combustível fóssil, o que leva muitos consumidores a optarem pelo segundo.
Por sua vez, os preços do diesel tiveram reajuste de 8,9% no final de setembro, passando de R$ 2,81/litro para R$ 3,06/litro, conforme anunciado pela Petrobras. A estatal afirma que os preços devem se manter estáveis por 85 dias e que o aumento é reflexo do incremento nos preços do petróleo e do câmbio.
Para concluir, os cinco principais fatos para acompanhar em novembro na cadeia da cana:
1. As chuvas voltaram neste outubro, se pelo menos não trará efeitos agora já que a colheita se aproxima do final, ajudará na cana de 2022. Terminando a safra com cerca de 525 toneladas moídas, e com o consumo semelhante ao de 2020, esta entressafra trará emoções.
2. Consumo de combustíveis. Qual o efeito do grande aumento de preços no consumo? Precisamos acompanhar de perto. A gasolina subiu novamente e o etanol hidratado, ao fechar esta coluna, pelos dados da SCA, estava em R$ 4,14/l com impostos nas usinas, e o anidro em R$ 4,08/l, aumento considerável em relação ao mês passado e devem seguir aumentando;
3. O barril do petróleo tipo Brent estava em incríveis US$ 84, trazendo grande impacto na inflação, nos custos e nos preços. O que será que acontecerá em novembro? Especialistas não creem em mudança rápida, e estamos perante uma situação de escassez de energia no mundo;
4. Ao fechar esta coluna, o açúcar estava em 19,9 cents/libra peso na tela de outubro de 2021. Um preço muito alto pode não ser bom, colocando em risco a velocidade da Índia na adoção do etanol e trazendo de volta produções em outros locais, este é o receio neste momento;
5. Os problemas de abastecimento de insumos e as necessidades da cana para boa performance na safra 2022/23.
Valor do ATR: a safra 2021/22 teve início com valores de ATR em abril e maio de, respectivamente, R$ 1,0141/kg e R$ 1,0564/kg. Já para o mês de junho, o valor manteve a tendência de alta, alcançando R$ 1,0630/kg. Em julho, o indicador voltou a crescer, atingindo R$ 1,0878/kg, comportamento que se manteve em agosto, chegando a R$ 1,1425/kg. Em setembro mais um grande aumento, chegando a 1,209. Assim, o valor acumulado até agora é de R$ 1,10/kg. Persistindo estes aumentos, ao final desta safra pode ainda chegar a algo entre R$ 1,15 a 1,18.
*Marcos Fava Neves, Professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP em Ribeirão Preto e da EAESP/FGV em São Paulo, especialista em planejamento estratégico do agronegócio.