Há algum tempo, temos procurado chamar a atenção sobre a necessidade de uma nova visão para o planejamento do setor elétrico. As nossas preocupações têm como alvo as tarifas crescentes, os subsídios e a segurança de abastecimento. Faz tempo que cometemos erros recorrentes e temos tido a sorte de nos safar de apagões elevando as tarifas, sempre ajudados pela falta de crescimento econômico.
Temos um problema de potência e o planejamento do governo insiste na solução vinda das energias intermitentes e das linhas de transmissão. Diagnóstico equivocado que tem promovido grandes volatilidades nos preços e pode levar a apagões. Neste ano o pesadelo voltou e parece que de uma maneira mais forte. No fim de maio os níveis de reservatório deverão ser de 31,7%, isso é pelo menos 4,6 pontos abaixo da mínima histórica. Em 2019 e 2020 choveu muito em fevereiro, março e abril, com isso os reservatórios ainda aumentaram o nível. O que não foi o caso em 2021. Se considerarmos a média dos últimos 16 anos, já no fim de agosto poderemos estar com o nível abaixo de 20% e poderemos alcançar valores muito abaixo de 10% a partir de outubro. Isso tem levado a um estresse na operação do sistema de armazenamento do Sistema Interligado Nacional (SIN).
Portanto, precisamos tomar providências de curto prazo e soluções estruturais devem ser implementadas para evitar pesadelos futuros. Mas agora estamos em urgência. E o que fazer no curto prazo? Primeiro, deixar que os preços indiquem a real situação do setor elétrico. Na realidade, hoje nem o PLD a R$ 250/MWh nem a bandeira vermelha nível 1 retratam a realidade do setor elétrico. O correto é o PLD no seu nível máximo e deveríamos estar em bandeira vermelha nível 2 desde o início de abril. Além do mais deveríamos, também, já estar despachando todas as usinas não hidrelétricas na capacidade máxima, inclusive as a diesel.
Como foi feito em 2014/2015 quando tivemos um cenário parecido com o atual.
E a médio e longo prazos. O que fazer? A MP da Eletrobrás (1031) ao propor a implantação das térmicas a gás, com geração mínima de 70%, conta com mecanismos de financiamento de longo prazo, diluindo seu custo no tempo, trazendo os seguintes principais benefícios:
Redução das despesas com o acionamento das térmicas a óleo e diesel, sistematicamente despachadas, fora da ordem de mérito de custo, para garantia energética;
Elevação dos níveis dos reservatórios, aumentando sobremaneira a garantia do suprimento de energia e potência, permitindo o uso racional dos reservatórios, preservando a capacidade de atendimento não apenas do setor elétrico, como também do consumo humano, das atividades de lazer, indústria e agricultura;
Redução do impacto das bandeiras na conta do consumidor cativo e maior estabilização dos preços da energia a curto prazo e médio prazo, permitindo que o modelo de formação de preços de curto prazo dê o sinal econômico mais próximo da realidade;
Redução da necessidade de geração hidrelétrica para atendimento à demanda, porém com menor impacto financeiro, por causa de uma redução e menor volatilidade do PLD;
Aumento da segurança elétrica, com a implementação de geração térmica próxima aos centros de consumo, deslocando os acionamentos de termoelétricas a óleo, muito mais caras, por motivos de energia ou restrição elétrica, seja em regiões remotas ou ainda para equacionar a oferta na ponta da demanda;
Garantir a segurança do abastecimento possibilitando o contínuo avanço das fontes renováveis, intermitentes e sazonais, como eólica e solar;
Dar uma proteção necessária ao crescimento econômico do País e a potencial eletrificação dos meios de transporte;
Permitir a participação equilibrada de todos os consumidores, na estrutura de custo necessária a garantir o abastecimento de energia;
Matriz elétrica mais limpa com a substituição de térmicas a óleo por gás natural.
A quem interessa a manutenção da atual situação do setor elétrico? Aos que se beneficiam com a alta volatilidade dos preços da energia e àqueles que querem manter a anomalia onde os pequenos consumidores subsidiam os grandes consumidores.
*Adriano Pires, sócio-fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE).
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