Sonegação e complexidade tributária travam setor de combustíveis - Por Adriano Pires

Sonegação e complexidade tributária travam setor de combustíveis - Por Adriano Pires

Com a venda de refinarias e a expectativa de reforma tributária, o setor de combustíveis no Brasil passa por um momento importante, no qual deveríamos discutir o seu futuro com serenidade e transparência. O mercado brasileiro é complexo e diferente da grande maioria dos países, na medida em que tem de fazer gestão de fósseis e de biocombustíveis. Diante dessa complexidade, algumas coisas precisariam ser olhadas com atenção em qualquer tentativa de mudança regulatória. Por que não existem players estrangeiros? Por que empresas estrangeiras tradicionais em refino não fizeram oferta pelas refinarias da Petrobrás? Por que num mercado em que a escala é essencial e mesmo fundamental, como no Brasil, temos baixa escala nas movimentações dos combustíveis? Por que nenhuma empresa privada investe na construção de novos dutos?

Diante de tantos porquês, temos desafios para atender à oferta no horizonte decenal. É projetado um gap de 29,1 bilhão/litros no ciclo diesel e de 17 bilhões/litros no ciclo Otto entre 2017 e 2027.

O setor de distribuição de combustíveis já teve a presença de grandes empresas privadas estrangeiras que, nas décadas de 1990 e 2000, foram embora motivadas por regulação inadequada. Na época, em nome da concorrência, foi permitido o registro de centenas de empresas no antigo Departamento Nacional de Combustíveis (DNC), onde grande parte delas promoveu um aumento incontrolável da sonegação e da adulteração.

A nossa complexidade tributária acaba por incentivar a sonegação. São 27 legislações de ICMS, uma para cada Unidade da Federação. Para que tenhamos uma ideia, hoje o nosso etanol, que é o passaporte para que o Brasil tenha um papel preponderante na agenda ambiental, tem 45% do seu volume comercializado através da sonegação de impostos. Por isso, é preciso empenho e entendimento para que a reforma tributária adote a monofasia para a cobrança do ICMS e PIS/Cofins. Como vender o nosso etanol pelo mundo com esse nível de sonegação no mercado interno?

O mercado de distribuição de combustíveis precisa de escala. Infelizmente, ainda hoje existem empresas que só sobrevivem por causa da sonegação e da adulteração. Não podemos criar uma regulação que dê brechas para que empresas com o canto da sereia da concorrência sobrevivam por meio de práticas que, volto a repetir, só prejudicam o consumidor.

Estamos num momento muito esperado, dada a possibilidade de abertura total do mercado com a venda das refinarias da Petrobrás. No entanto, a regulação deve ser adequada ao novo funcionamento do mercado de refino, de forma a torná-lo atrativo aos investimentos. A nova regulação com a privatização das refinarias precisa estar comprometida com a modernidade e não voltar ao passado criando situações em que empresas que não estão comprometidas com o investimento, e sim, com sonegação e adulteração, proliferem no mercado brasileiro. Para garantir a concorrência é preciso uma aproximação maior entre a ANP, Cade, Secretarias da Fazenda Estaduais e a Polícia Federal.

Se quisermos um mercado saudável, precisamos aumentar a escala dos players em todos os elos da cadeia. Com escala, haverá aumento de investimentos em logística. Esses tipos de investimentos reduzem os custos. A nossa logística de transporte por dutos, de cabotagem e, mesmo, de ferrovia é ainda muito pequena para um mercado com o tamanho e a complexidade do brasileiro.

As importações terão um papel importante na contestação dos preços das refinarias locais. Mas, outra vez, será preciso escala para construção de terminais capazes de receber volumes relevantes para a importação.

Outro fato que merece atenção é a função de cada agente da cadeia (refinarias, distribuidoras, TRRs e posto revendedor). É preciso tomar muito cuidado para não misturar as funções entre os agentes, sob pena de desorganizar o setor.

Uma regulação populista, sem uma política tributária adequada, afasta os investidores. Um mercado competitivo exige estabilidade regulatória, paridade de preço com o mercado internacional, desinvestimento no refino e simplificação tributária. Assim, será possível efetivar o plano estratégico para transição energética, impulsionar as políticas para os biocombustíveis e termos papel de protagonistas na agenda ambiental.

*Adriano Pires, sócio-fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE)

 

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