Uma Seca como Nunca Antes Vista na História deste País - Marcos Fava Neves

Uma Seca como Nunca Antes Vista na História deste País - Marcos Fava Neves

Como está o nosso agro?: pelo terceiro mês consecutivo, em outubro, o desempenho das exportações do agronegócio sofreu queda. As exportações (US$ 8,95 bilhões), se comparadas com o mesmo período de 2013 (US$ 8,42 bi), diminuíram 5,7%. O saldo na balança do agro de outubro foi de US$ 6,51 bi, uma queda de 4,3% em relação a outubro de 2013.
 
O valor exportado acumulado no ano (US$ 83,9 bilhões) teve queda de 3,0% quando comparado com o mesmo período de 2013 (US$ 86,4 bilhões). O saldo acumulado no ano foi de US$ 69,7 bilhões (3,3% menor que o mesmo período em 2013). Se continuarmos nesse ritmo, fecharemos 2014 com um montante de US$ 101 bi, atingindo a meta dos 100 bi, porém cabe ressaltar que no acumulado de janeiro-outubro de 2013 tivemos uma exportação de US$ 86,4 bi e fechamos 2013 com a cifra de US$ 99,9 bilhões.
 
Os demais produtos brasileiros fora do agro tiveram uma grande queda de 27,9% nas exportações (US$ 14,4 bi em 2013, para US$ 10,4 bi em 2014), o que levou a participação do agronegócio nas exportações brasileiras a alcançar um patamar de 43,3% do total das exportações brasileiras.
 
O saldo da balança comercial brasileira acumulado no ano teve pequena recuperação em relação a outubro de 2013, saindo de um deficit de quase US$ 2 bilhões para um deficit de US$ 1,87 bilhão. Se não fosse o agronegócio, a balança comercial brasileira teria um déficit de US$ 72 bilhões acumulados no ano, ou seja, mais uma vez o agro evitou um desastre maior na economia brasileira.
 
Como está nossa cana?
 
Até 1º de novembro as usinas do Centro-Sul haviam processado 515 mi. t., 95% das 545 mi. t. esperadas para esta safra (UNICA). O ATR está um pouco melhor (146,2 kg/t, 5,6% maior). Realmente a seca foi de terrível impacto principalmente em certas regiões do Centro-Sul. A própria COSAN declarou que deve moer ao redor de 58 mi. t. de cana, contra 61,4 mi. t. na safra passada. E a empresa estima ainda que para a safra 15/16, o volume deve ser o mesmo deste ano.
 
O final da queima em SP representará quase 370 mil hectares a menos na produção (6,7% da área do Estado), em 2017. Um dos municípios mais afetados será Piracicaba, que perderá 17% da área.
 
Como estão as empresas do setor?
 
Boa notícia veio da São Martinho, que apresentou lucro de R$ 115 milhões no trimestre, puxado principalmente pelos resultados em eletricidade, onde preços médios ficaram ao redor de R$ 600 o MW e a empresa produziu 44% a mais.
 
Também estive presente no momento onde a Odebrecht comunicou ao mercado (evento da UDOP) que investirá apenas 50% do previsto neste e nos próximos anos, sendo que o objetivo é o de encher as usinas com cana. Nada de expansão industrial.
 
A Tereos, que é o quinto maior grupo mundial de açúcar, anunciou a criação de uma trading que pretende distribuir 15% do açúcar mundial até 2020. Percebem-se muitos movimentos nesta área, que deve ser dominada por gigantes, como a recente joint-venture entre Copersucar e Cargill.
 
Como está o açúcar?
 
Saiu a nova projeção da Organização Internacional do Açúcar. Para a temporada 2014/15, com início em outubro de 2014, prevê um superávit menor, de 473 mil t (produção mundial de 182,9 mi t e consumo de 182,4 mi t). As exportações do Brasil devem ser quase 1 mi t menores, caindo de 24,7 para 23,9 mi t. O relatório mostra grande crescimento nas exportações da Tailândia. O ponto positivo é que a OIA sinaliza que para 2015/16, devemos ter um deficit de 2 milhões de toneladas, mostrando já um efeito desestimulador dos preços baixos.
 
Espera-se que a Índia exporte ao redor de 1,5 mi. t. A Índia e sua política de subsídios governamentais é algo que atrapalha os preços dos produtos da cana no Brasil. Quando se espera que as forças de mercado atuem por lá, e baixos preços tragam menor produção, vem o Governo e interfere nas regras, mantendo uma produção elevada.
 
Há de se observar também os efeitos do câmbio nas exportações e no preço do açúcar. Muitas usinas fixaram o açúcar com câmbio a 2,60. O preço do açúcar a este câmbio, quando convertido para reais passa a ficar interessante.
 
Como está o etanol?
 
O tão esperado reajuste na gasolina veio, mas decepcionou o mercado. Apenas 3%, o que não resolve a questão da Petrobras nem do setor de cana. Fora isto, ao aumentar o diesel em 5%, o Governo aumenta os custos de produção do setor.
 
A aprovação da mistura de 27,5% de anidro na gasolina depende agora de reunião entre Governo e setor privado. A demanda do setor privado é que a mistura comece já a partir de 1º de janeiro de 2015, sendo garantidos os suprimentos de anidro.  
 
As usinas mais capitalizadas estão estocando etanol para a entressafra, o que deve aumentar ainda mais o fosso existente entre estas e as usinas endividadas.
 
Temos também que observar eventual menor crescimento ou até queda no consumo de combustíveis com a crise que se aproxima cada vez mais da economia brasileira. Com isto, cai também o consumo do etanol.
 
Como está a cogeração?
 
Com o elevado endividamento do setor, muitas usinas estão vendendo ou arrendando as estruturas de cogeração, para melhorar o perfil do endividamento. Por ser uma unidade bastante atrativa, estima-se que a maior capacidade existente é a da Cosan, com 900 MW, seguida pela Odebrecht, com 740). A Odebrecht vendeu esta capacidade para outra empresa do grupo, melhorando o perfil da dívida. Estima-se que 25% da capacidade instalada de cogeração tenha trocado de mãos. Se alivia a dívida no curto prazo, a venda da cogeração é uma ação que tira um dos principais ativos das usinas, portanto pode destruir valor no médio prazo. O ideal seria que o próprio grupo investisse na expansão.
 
Fora isto, ainda há possibilidade de se usar menos energia para se produzir açúcar, liberando mais bagaço para comercialização de eletricidade. Segundo a Guarani, no Brasil gasta-se 50% a mais de energia quando comparado à França, para se produzir a mesma quantidade de açúcar. Além deste, muito investimento ainda pode ser feito na eficiência das caldeiras. A própria Biosev declarou que as caldeiras em 2014 produziram 28 quilowatts/t, contra 23,6 qw/t em 2013. Ou seja, temos grandes ganhos ainda nesta área.
 
Quem é o homenageado do mês?
 
A coluna Caipirinha todo mês homenageia uma pessoa. Neste mês a homenagem vai para o amigo Renato Buranello, advogado e especialista em agronegócios, grande estudioso e conhecedor do setor.
 
Haja Limão: a operação Lava-Jato da Petrobras revela provavelmente o caso mais escabroso que se tem notícia de corrupção no Brasil. Revoltante a todos nós. Graças a uma parte boa do nosso Judiciário e da nossa Polícia Federal veremos muita coisa ainda. Gente presa, gente devolvendo dinheiro, e quem sabe uma assepsia em Brasília, no sistema econômico e político. Enquanto termino a coluna deste mês, abro a página de um dos nossos principais jornais e vejo que (u)Um simples gerente da Petrobras abocanhou US$ 100 milhões. Isto mesmo CEM MILHÕES DE DÓLARES. A presidência da empresa nada sabia, nada percebia, a presidente do conselho da empresa nada sabia, nada percebia. Não acreditam serem responsáveis por nada, apesar de terem honorários.
 
E os estudantes do Brasil, os Centros Acadêmicos, a UNE… permanecem… adormecidos… vendo o maior saque feito no patrimônio público, no patrimônio do povo brasileiro. Fica a pergunta do porquê da omissão total desta nova geração que vem vindo. Em 1992 saímos às ruas e o então presidente foi derrubado por estudantes, por muito menos que isto tudo. Hoje o considero um homeopata perto desta turma. Mas esta turma não vê nada de errado. Triste país.
 
Marcos Fava Neves é Professor Titular da FEA/USP, Campus de Ribeirão Preto. Em 2013 foi Professor Visitante Internacional da Purdue University (EUA)